08/03/2005
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Michelle Melo
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As divas bregas, como Michelle Melo, conquistam legião
considerável de fãs cantando músicas que falam de paixão desenfreada,
traição e sexualidade à flor-da-pele, dando vida a um modelo de mulher
mais próximo do ‘povão’
DIANA MOURA BARBOSA
Desde meados do século 20, as mulheres começaram a lidar com a tão
falada liberação sexual, item importantíssimo na comemoração do Dia
Internacional da Mulher. De lá para cá, elas tiveram que encarar a
novidade de diversas formas: queimaram sutiã, alcançaram empregos bacanas,
conseguiram o direito ao divórcio e mais um monte de pequenas conquistas
do dia a dia. A indústria cultural, claro, veio a reboque, e criou uma
série de produtos para atender a nova classe consumidora: revistas de
moda, beleza e sexo, filmes com temáticas femininas, sutiãs poderosos
apoiados em campanhas de marketing vitaminadas. Agora, é a vez de mulheres
das classes sociais chamadas eufemisticamente de menos favorecidas
conquistarem um cobiçado espaço entre as consumidoras de produtos
culturais. E, para elas, a liberação sexual veio num só pacote, que inclui
roupas curtas (curtíssimas), letras de gosto duvidoso, muita maquiagem e
uma enxurrada de música brega que não acaba mais.
A quantidade de bandas do chamado brega romântico não pára de crescer.
As músicas falam de sexo, com todas as matizes possíveis. As estrelas
dessas bandas – das que fazem mais sucesso, pelo menos – são todas
mulheres. Elas são a imagem, a voz e, principalmente, os gemidos dessas
músicas, que tocam em dez entre dez FMs voltadas para o público das
classes C e D.
Nas canções monotemáticas que entoam, narram encontros e desencontros
amorosos. Numa hora, assumem paixões, noutra, pedem perdão por uma
traição, em seguida, explicam ao ex-namorado que encontraram outro homem
para fazê-las felizes, depois, ligam para as esposas de seus amantes e
exigem que as deixem em paz. O cardápio, como se pode ver, não é muito
variado. Mas agrada um público que nunca tinha visto seu universo tão bem
retratado. E, melhor ainda, tudo isso custa apenas de R$ 5 a R$ 10, em CDs
independentes vendidos em cada esquina. É vanta!
Para a psicóloga Ana Paula, que atente na organização
não-governamental (ONG) SOS Corpo, as bandas de brega não são sinônimo de
liberação sexual, mas um reflexo de um processo que já vem acontecendo há
duas décadas. “Essas bandas são apenas um produto comercial que usa o sexo
para vender. Não estão preocupados com a igualdade entre homens e
mulheres, apenas com a satisfação do desejo. Expressam um corpo cujo único
objetivo é dar prazer ao outro. Há mais de 20 anos, os movimentos
populares de Pernambuco atuam para disseminar uma igualdade de gêneros,
para dar voz às mulheres. É claro que a liberdade delas aumentou e algumas
resolvem se expressar dessa forma. Então, uma das conseqüências disso é o
brega”, aponta.
Esse tratamento comercial da liberação feminina pelo brega fica ainda
mais evidente quando se sabe que a maioria das letras são escritas por
homens. Sem contar que quase todas as cantoras são empregadas das bandas,
onde os homens também dão as cartas – com exceção de Michelle Melo, Palas
e Nega do Babado, que têm suas próprias bandas/empresas.
A vida das cantoras é vigiada pelos seus chefes. Muitas são proibidas
de dizer que têm namorado, elas quase nunca podem sair depois dos shows e
são obrigadas a se vestirem como a banda toca. Ou seja, atrás da pose de
mulheres sexualmente liberadas, escondem-se funcionárias-padrão com pouca
liberdade para manobrar suas carreiras. Tanto que a cantora Dayanne, 16
anos, da Frutos do Amor, estuda para fazer vestibular para jornalismo e
têm consciência de que a vida como cantora de brega dificilmente será
duradoura. “Eu sou uma grande mulher para o futuro”, proclama.
Visivelmente constrangida com os trajes mínimos que usa no palco, ela
explica que se sente incomodada com o fato de algumas pessoas confundirem
a Dayanne dos palcos com a Daiane da vida real. “Não gosto muito da imagem
que as pessoas criam. Tem gente que não entende que isso é um trabalho,
uma profissão, e desvaloriza a cantora de brega. As pessoas só vêem o lado
mal”, desabafa. Desconfiada, ela acha que as mulheres devem ter um pé
atrás com os namorados e maridos e, para o Dia Internacional da Mulher,
manda um recado: “A mulher deve se amar muito, ser persistente no que quer
e não se entregar a um relacionamento. Tem que pensar positivo e cuidar do
futuro”.
Cuidar do futuro foi o que fizeram Palas e Michelle Melo, que deixaram
a Banda Metade e fundaram suas próprias empresas. Palas é sócia da Ovelha
Negra e Michelle trabalha com uma banda com seu próprio nome. Desde que
deram seus gritos de liberdade, elas mudaram também o discurso. Hoje,
reafirmam o poder e a independência da mulher. Michelle, por exemplo, é
clara ao dizer que agora veste apenas as roupas que quer, canta as músicas
que bem entende e dança como gosta. “Não preciso exibir meu corpo. O que
conta é a qualidade da música e a minha voz”, defende.
Embora evite entrar em atrito com os ex-patrões, para bom entendedor,
meia palavra basta: a Michelle de hoje recusa a exposição desnecessária do
seu corpo. Ela explica que, com o tempo, aprendeu a diferença entre o
vulgar e o sensual. Essa distância, Nega do Babado diz que sempre soube.
Grávida de cinco meses, Nega só se apresenta muito vestida, mas isso não
impediu que seu primeiro trabalho, Milkshake, estourasse nas
rádios. Ela é um sucesso absoluto.
(©
JC Online)
Brega se inspira
no pop made in USA
Infográfico |
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Letras brasileiras parecem tímidas diante dos textos explícitos de
canções de estrelas que ocupam topo das paradas norte-americanas
O termo “liberação sexual” ainda é muito leve para descrever o conteúdo
das músicas bregas. Melhor seria falar de “escancaração”. As canções
chegam a falar de sexo de forma explícita, sem meias palavras. Tanto que a
vocalista da Frutos do Amor, Dayanne, de 16 anos, foi proibida pela DPCA
de cantar a música Relaxa em programas de televisão. Acontece que
esse fenômeno não é exclusividade brasileira. Essa é mais uma aquisição
importada dos Estados Unidos. As musas do R&B, assim como alguns ícones do
pop, entoam versos para lá de picantes. É o caso de Janet Jackson, ela
mesma, a irmã do garoto-problema do momento, Michael Jackson.
Pois não é que Janet tem uma certa predileção por cantar, em detalhes,
tudo o que quer fazer com seu par? Na letra de Would you mind (Você
poderia imaginar?), ela pede para ele imaginar, passo a passo, o que faria
com ele: brincar, beijar, abraçar, tocar, lamber, fazer amor, sentir o
gosto, cavalgar e uma listinha de verbos ainda menos pudicos. Miss Jackson
termina a música com a seguinte frase: “Baby would you mind coming inside
of me/ Letting your juices free/ Deep in my passion” (Baby, você poderia
se imaginar dentro de mim/ Liberando seus sucos/ Profundamente na minha
paixão), com direito a rima de duplo sentido e tudo o mais.
Estrela de adolescentes do mundo inteiro, Britney Spears também é
chegada a canções pouco proveitosas para mentes férteis e cheias de
hormônio. Em Breath on me, ela avisa: “boy, don’t stop ‘coz I’m
half way there” (Rapaz, não pare, porque eu ainda estou no meio do
caminho).
A cantora Kelis também gosta de ir direto ao assunto: “Let’s make a
movie baby/ Can we get away with it? (voz masculina: Open your legs/ I’ll
be your animal)/ All lights on/ I like it when we do it to this song/
Let’s make a movie baby”. Traduzindo: “Vamos fazer um movimento, baby/ Nós
podemos continuar assim? (voz masculina: abra suas pernas/ eu serei seu
animal)/ Todas as luzes acesas/ Eu gosto quando nós fazemos isto com essa
música/ Vamos fazer um movimento”.
A diferença é que a baixaria enlatada não dói nos ouvidos e ninguém
pensa no que está cantando. Diante das letras gringas, o cancioneiro
brasileiro até parece tímido. Mas, de todo jeito, enquanto as bandas
estiverem lucrando, as músicas de duplo sentido (ou de um sentido só) vão
continuar enchendo as FMs de gemido. (D.M.B.)
(©
JC Online)
Livro trata da
mulher na mitologia
Dicionário Fêmeo, da antropóloga Helena Pessoa, tem lançamento oficial
hoje
OLÍVIA MINDÊLO
O Dia Internacional da Mulher geralmente é usado como pretexto,
pelas livrarias e editoras, para lançar no mercado ou destacar nas
prateleiras livros ditos como ideais para a mente feminina. Incluem-se aí
títulos de auto-ajuda, ‘blá-blá-blá’ sobre relacionamentos e histórias
românticas que mais colocam a mulher em condição acéfala do que de leitora
inteligente. No meio dessas recomendações para a data, ainda restam
algumas que se salvam em termos de conteúdo. É o caso do dicionário de
mitologia grega Fêmeo, que já está nas principais livrarias da
cidade e tem lançamento oficial hoje, às 14h, na Oficina Cerâmica
Francisco Brennand, e na quinta, às 17h, na Livraria Cultura (Bairro do
Recife).
Escrito pela antropóloga pernambucana Helena Pessoa, o livro é
resultado de uma pesquisa de sete anos e reúne 810 verbetes de personagens
femininas do universo mitológico grego. “Existem muitos dicionários de
mitologia, mas nenhum deles traz só verbetes femininos, nem separa por
personagens, digo, ninfas, heroínas e mortais, que chamo de mulheres
funcionais neste livro”, explicou a autora, que dá um tom feminista à
publicação ao ressaltar como o patriarcalismo se firmou na cultura
ocidental através dos gregos. “A história das mulheres, de um modo geral,
está ali na mitologia grega”, completou.
Não é a primeira vez que a mulher é objeto de estudo da antropóloga.
Helena já havia feito um mestrado, no Maranhão, sobre uma comunidade negra
feminina, formada por quebradeiras de babaçu e agricultoras. A idéia, ou
‘alucinação’, como diz, de escrever o dicionário surgiu depois da sua
aposentadoria, que a levou à pesquisa na área.
Com 210 páginas, o livro traz, na capa, ilustração com escultura de
Brennand – a obra O Ventre. O lançamento de hoje é fechado ao
público, mas na quinta, é aberto. O dicionário custa R$ 80, nas livrarias.
(©
JC Online)
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Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)
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