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 Glauber Rocha escreve epopéia do cinema brasileiro

18/04/2003

 

 

 

Glauber Rocha

 

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

   Glauber Rocha (1939-81) está de novo no centro das discussões sobre o cinema brasileiro. E alguma vez deixou de estar?

   Um dos marcos inaugurais de sua trajetória de controvérsias, o livro "Revisão Crítica do Cinema Brasileiro", está sendo relançado pela editora Cosac & Naify, em edição reforçada por um consistente prefácio do crítico Ismail Xavier e por uma compilação das principais críticas publicadas no país quando o volume veio à luz, no longínquo 1963.

   O impacto do furacão Glauber Rocha não ficou restrito ao Brasil, como atesta "Glauber - Um Olhar Europeu", do italiano Claudio M. Valentinetti, recém-lançado pelo Instituto Lina Bo e P. M. Bardi.

   Mas voltemos à "Revisão". Em 1963, o Cinema Novo dava seus primeiros passos. Glauber só havia feito "Barravento" (1961). Seu livro, um exame passional da cinematografia brasileira até então, pareceu a muita gente um precário panfleto escrito por um petulante fedelho de 24 anos.

   O que justificaria essa "Revisão Crítica" e acabaria por transformá-la num dos textos mais influentes já publicados sobre o cinema brasileiro seria a obra cinematográfica do autor.

   Arma de combate, demarcação de território, plataforma de geração, "Revisão Crítica" é um apanhado histórico fortemente marcado pelas opções estéticas e políticas de seu autor.

   Num texto adjetivado e sentencioso, Glauber condena sem remissão o cinema paulista como um todo, por seu artificialismo e sua ilusão industrial. Eleva às alturas Humberto Mauro, pintando-o como uma espécie de fonte límpida do Cinema Novo.

   Mesmo sem ter visto "Limite", descarta Mário Peixoto como um talento desperdiçado pelo narcisismo e pelo idealismo burguês. Na mesma vala, lança Walter Hugo Khouri.

   Apesar do "parti pris" e do tom militante, há passagens de uma acuidade de análise admirável. Por exemplo, nas páginas sobre "O Cangaceiro" (1953). Cabe lembrar que, no momento em que dissecava impiedosamente o épico sertanejo de Lima Barreto, Glauber preparava seu próprio mergulho no cangaço e no sertão, "Deus e o Diabo na Terra do Sol".

   À luz da filmografia de Glauber, o próprio "Revisão Crítica" pode ser lido como um épico, o do nascimento de um cinema, povoado de dragões da maldade e santos guerreiros.

   Sobrou pouco espaço para falar do livro de Valentinetti. Só cabe dizer, sumariamente, que se trata de uma rica abordagem da obra de Glauber, filme a filme, inserindo-a no contexto cultural e histórico do Brasil, que Valentinetti -tradutor de Jorge Amado e João Ubaldo- conhece bem.

   Mais que isso: o livro faz uma espécie de compêndio da recepção crítica do cinema de Glauber na Europa, em especial na Itália e na França, mostrando que a arte do diretor baiano ajudou a fecundar e arejar o melhor pensamento sobre cinema no mundo.

Revisão Crítica do Cinema Brasileiro
Autor: Glauber Rocha Editora: Cosac & Naif Quanto: R$ 45 (240 págs.)

Glauber - Um Olhar Europeu
Autor: Claudio M. Valentinetti Editora: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi (tel. 0/xx/11/3744-9902) Quanto: R$ 35 (195 págs.)

(© Folha de S. Paulo)


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