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Canhoto da Paraíba homenageado por Lula

05-06-2008

Canhoto da Paraíba, em foto do disco Fantasia Nordestina

   

Presidente receberá o violonista, que deixou de tocar há seis anos devido a uma isquemia cerebral, no relançamento do Projeto Pixinguinha

JOSÉ TELES

   O violonista e compositor Francisco Soares de Araújo, 76 anos, mais conhecido como Canhoto da Paraíba, será homenageado pelo presidente Lula, hoje, no Palácio do Planalto, em cerimônia que relança o Projeto Pixinguinha. Canhoto da Paraíba estava escalado pela segunda vez para o projeto, quando este foi extinto, no governo Collor. Porém, infelizmente não poderá participar desta nova edição, muito menos tocar para o presidente algum dos choros que o fizeram ser cultuado por músicos como Jacob do Bandolim, Radamés Gnatali ou Paulinho da Viola. Há seis anos anos o violão de Canhoto da Paraíba emudeceu. Em conseqüência de uma esquiamo cerebral ele não consegue mais mover o braço esquerdo.

   Na modesta, mas confortável, casa onde mora com as filhas (a esposa faleceu há um mês), em Maranguape I, Paulista, Canhoto deixa transparecer uma resignação rara. A solenidade em Brasília não o deixa ansioso. Preocupa-se mais com a viagem que pretende fazer em seguida: “Estou pensando em ir à Princesa, na Paraíba, rever os amigos, os irmãos”. Princesa Isabel, no Sertão da Paraíba, é a cidade natal de Chico Soares, como alguns o chamam. Lá ele viveu até os 25 anos, e aprendeu, aos 12, os primeiros acordes no violão do pai. “Nunca inverti as cordas. Eu decorava as posições e depois repetia. Assim fui aprendendo. Engraçado é que eu escrevo com a mão direita, mas no violão só pegava com a esquerda”.

   Ele chegou a formar um regional em Princesa, com amigos e os irmãos. “José, um irmão meu também tocava, mas mexendo no cilindro de uma padaria perdeu a mão”, conta Canhoto, sem alterar a voz nem lamentar o acontecido. Alguns rotulariam sua atitude de zen, outros de fatalista. Ele simplesmente aceita o que lhe reservou o destino sem se queixar. Além de elogios sem conta, amizades, e o prazer de tocar por tocar, Canhoto ganhou pouco dinheiro com música. Vive de uma pequena aposentadoria. Renda de direitos autorais não recebe. Em casa tem apenas dois dos seis discos que gravou (o primeiro, Único Amor, lançado pela Rozenblit, e o último, Pisando em Brasa, saído pela Kuarup).

   Mágoas não guarda. Durante a entrevista, concedida na varanda de casa (“É minha vida agora, da cadeira de balanço pra cama”), só se queixou de uma pessoa, o também violonista Toquinho, mesmo assim foi mais um comentário: “Ele me viu tocar, no Teatro do Parque, com um violão arranhado e prometeu que me daria um novo. Eu nem precisava, naquele tempo possuía cinco violões, mas aceitei. Quando fui em São Paulo, liguei pra casa de Toquinho, e ele se escondeu pra não me receber. Toquinho é meio safado. Paulinho (da Viola) não. É meu amigo, sempre que vem no Recife me visita”.

   Foi Paulinho da Viola o responsável pelo primeiro disco bem produzido de Canhoto da Paraíba, O Violão Brasileiro Tocado pelo Avesso (Marcus Pereira, 1977, fora de catálogo). Com esse álbum, elogiadíssimo, Canhoto poderia ter aproveitado e mudado-se de vez para o Rio, como aconteceu com outros músicos que fizeram carreira no Rio ou em São Paulo. Muitos dos quais seus admiradores confessos, como o bandolinista Luperce Miranda, o violonista Meira, o gaitista Rildo Hora. Mas Chico Soares optou por continuar no Recife: “Tive vontade de morar lá. Mas quando vi aquele inferno, aquele corre-corre, preferi ficar aqui. Ganhei inclusive o título de Cidadão Pernambuco”. Canhoto da Paraíba também não é tão modesto assim. Por duas vezes ele convida, orgulhoso, para assistirmos a uma cópia do documentário Chico Soares: O Canhoto da Paraíba realizado este ano, por José Vasconcelos Vieira.

(© JC Online)


Violonista inventou técnica única de tocar

   Já faz parte da lenda da música pernambucana, a viagem, de jipe, empreendida em 1959, por um grupo de instrumentistas do Recife para conhecer Jacob do Bandolim, no Rio. Uma viagem que levou cinco dias, mas foi recompensada pela acolhida de Jacob do Bandolim: “Ele enfeitou a frente da casa com bandeirolas, convidou Pixinguinha, Radamés. Gostaram muito das minhas músicas”, relembra Canhoto, sem acrescentar um fato acontecido nesse sarau.

   Meia-noite, o maestro Radamés Gnatali, aditivado com várias doses de uísque, pediu que Canhoto tocasse novamente o choro Lembrança que ficou. Ele tocou, e entusiasmado, Radamés atirou o copo de uísque no teto. Enquanto viveu Jacob do Bandolim conservou a mancha intocada, para relembrar a memorável noitada. Canhoto não conta esta história ao relembrar sua primeira ida ao Rio. Prefere falar sobre os grandes músicos que conheceu. Luperce Miranda, por exemplo: “Tocava muito rápido, tinha muita técnica. Quando toquei com ele, comentou para outro músico: ‘O garoto aqui é bom’. Eu aprendia ligeiro a acompanhar ele”, diz Canhoto.

   De sua própria técnica fala muito pouco. A forma como toca, do lado esquerdo, sem inverter cordas, faz com que sua música seja difícil de passar para a pauta. A baixaria do violão ele faz com os dedos que normalmente são usados para solo. Ele sola com o polegar. Como Canhoto nunca aprendeu a escrever música, a partitura nunca reflete exatamente a forma como suas composições são tocadas.

   Paulinho da Viola nunca se cansa de elogiar a beleza e dificuldade da música de Canhoto da Paraíba: “Minha primeira música foi Saudades de Princesa. Paulinho da Viola diz ter ficado espantado por eu fazer um choro tão difícil já naquele tempo”, diverte-se, Canhoto, que confessa ter encontrado dificuldades para acompanhar Djavan: “A música dele é complicada, é boa, mas complicada de tocar”. O melhor violonista que já viu? “Rafael Rabelo, o melhor de todos. Ele veio aqui em casa. Nós dois tocamos ali, (aponta para um pé de jambo, no jardim) só músicas minhas. Ele sabia todas. Foi gravado em fita. Acho que está ainda aqui em casa, não sei.” (J.T.)

(© JC Online)

Governo religa circulador de música
 

Presidente Lula prestigia hoje o relançamento do Projeto Pixinguinha e anúncio de série itinerante para concertos

Helena Aragão

   A festejada volta do Projeto Pixinguinha começa a ter seus contornos desenhados. A série, que fez história de 1977 a 1997, ao promover o intercâmbio de músicos populares em shows que rodaram o país, será retomada com toques de nostalgia e pompa. Seu lançamento oficial será hoje à tarde, em Brasília, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Cultura Gilberto Gil e o presidente da Funarte Antonio Grassi, além de cantores e compositores tomados por boas lembranças dos tempos de ouro do evento.

   - Trata-se de um projeto de grande sensibilidade, que representa exemplarmente o objetivo do Ministério da Cultura de fazer a arte circular - explica Antonio Grassi.

   Dentro desse espírito de ''circulação de artes'' que a Funarte quer adotar, Grassi já anunciou projetos do mesmo porte para a dança, o teatro e as artes plásticas (cujos editais já estão disponíveis no site www.funarte.gov.br). Hoje, aproveitará o embalo do Pixinguinha para apresentar uma nova série itinerante, desta vez para a música de concerto, com verba de R$ 2 milhões da própria Funarte.

   - Vamos abrir edital para este projeto na semana que vem. Pessoas físicas ou jurídicas poderão se inscrever por meio de produtoras - completa Grassi.

   O Projeto Pixinguinha volta à cena graças ao Programa Petrobras Cultural - que destinou 1,5 milhão para este ano -, além de verba de 1 milhão do Fundo Nacional de Cultura. A Funarte pagará com essa verba os cachês dos músicos e passagens aéreas. Os municípios arcam com os custos de estadia, alimentação e locomoção.

   - A primeira etapa terá 39 municípios, incluídas aí as 27 capitais. Na segunda fase, em 2005, vamos ampliar o número de municípios e de artistas - acrescenta Grassi.

   O primeiro grupo a viajar pelo Pixinguinha é o único que foi convidado, por ser composto de músicos que participariam da última caravana a rodar o Brasil em 1997, se o projeto não tivesse sido cancelado nesse ano por falta de verbas. Gente como Dona Ivone Lara, Miltinho, Mário Adnet, Jane Duboc, Sebastião Tapajós, Ellen de Lima, Caio César, Zé Renato, Joyce, o grupo Época de Ouro e Billy Blanco já prepara o espírito para as viagens. Boa parte deles estará na cerimônia de hoje, convidados pelo MinC.

   Billy, que completou 80 anos recentemente, diz só ter boas lembranças da série.

   - Não havia o que criticar, era um projeto organizado. E acho que pode ficar ainda melhor - crê o compositor.

   O violonista Mário Adnet está animado com a retomada da parceria com Joyce, que faria em 1997:

   - O Pixinguinha teve altos e baixos, mas nunca deixou de lado seu objetivo de formar platéia. A música precisa de ambientes favoráveis para acontecer.

   Fora este grupo que dá a partida ao projeto, todos os outros participantes - mesmo os consagrados - terão que passar por um processo de seleção. De quarta-feira ao dia 9 de julho, as inscrições poderão ser feitas de todo o Brasil por meio do edital disponível no site da Funarte. Secretarias estaduais e municipais que firmaram parcerias com a instituição federal também poderão sugerir cantores e instrumentistas em cada região. Serão quatro circuitos passando pelas cinco regiões, a partir de setembro.

   - A idéia é que músicos de uma região se apresentem em outras, justamente para estimular a projeção nacional. Eles serão escolhidos até agosto por uma comissão formada por gente de vários estado. Por enquanto os nomes serão mantidos em sigilo, justamente para não sofrerem nenhum tipo de pressão - ressalta Ana de Hollanda, a coordenadora do Centro de Música da Funarte.

(© JC Online)

 

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