Com o show e disco Tear, cantor pernambucano mostra que está pronto
para ganhar o País
MARCOS TOLEDO
O cantor e compositor Zeh Rocha nunca esteve tão pronto para se
lançar como um músico popular brasileiro – deixando de lado o
estigma de um músico local – quanto agora, com seu segundo disco
solo, Tear. Este foi um dos aspectos importantes revelados no
show de lançamento do trabalho, que o artista fez na noite da última
sexta-feira, no Teatro do Parque.
Com uma banda tão jovem quanto instigada, Zeh Rocha – que domingo
completou e comemorou seu 53 anos (a maior parte dedicada à ralação
na música) com uma tarde de autógrafos na Livraria Cultura – exprime
uma renovação que transcende a arquitetura de sua obra. Esta
renovação se expressa na postura e na alegria do artista no palco,
em meio a muitos amigos, alguns companheiros de longa data, outros
seguidores recentes.
Aí, revela-se outro aspecto importante do show Tear: mesmo
não tendo o compositor alcançado o prestígio que outros parceiros
obtiveram (Lenine o exemplo máximo), ficou clara a influência sobre
músicos das últimas gerações que participaram da festa, como o
também cantor Izidro e, declaradamente, de Públius Lentulus,
multiinstrumentista que confessou tocar no início de sua banda,
Azabumba, uma das canções que dividiu com Zeh no palco, Festejo,
que data da época do Flor de Cactus, grupo do autor nos anos 70.
E essa interação foi mais além. Esteve presente em sua própria
banda, formada pelos também muito jovens Juliano Holanda, Carlos
Amarelo (ambos também da Azabumba) e Rudá Rocha (que toca com
Juliano na Terno de Terreiro, de Maciel Salu), quase uma família,
nas participações especiais dos guitarristas Lulu Oliveira (produtor
e arranjador do CD, e uma revelação cantando a sua Xamã) e
Júnior Ferreira, e do trombonista Dió, e de outros artistas
convidados que estão no front há muito tempo, a exemplo do irmão
Alex Mono, do poeta Jessier Quirino (que, além de cantar, recitou
seu poema Maria pano de chão) e do também cantor Geraldo
Maia.
Esse show - no qual Zeh Rocha mostrou todas as 13 faixas do
disco, mais Raiz, Morena rara e a supracitada
Festejo (nenhuma do primeiro CD, Loas, lendas e luas) –
serviu também para saber que o público recifense precisa descobrir
(ou redescobrir Zeh Rocha). Caberia mais gente no Teatro Parque,
público que certamente não se arrependeria de conferir um
espetáculo, guardadas as devidas proporções orçamentárias, com uma
qualidade semelhante a de qualquer medalhão da MPB que sobe naquele
mesmo palco, por exemplo, no projeto Seis e meia. Com uma
direção mais severa e pequenos caprichos (backing vocal dos demais
integrantes da banda, menos conversa com o público), Tear
está pronto para cobrir o Brasil.
(©
JC Online)
Zeh Rocha
estende tecido musicalCantor e compositor lança
novo disco com show no Teatro do Parque, mostrando um
trabalho maduro e aberto a novas experiências
MARCOS TOLEDO
Um trabalho que o cantor e compositor Zeh Rocha vinha
tecendo já há mais de dois anos finalmente ficou pronto. Tear,
seu segundo álbum solo, independente, revela a evolução de um
artista experiente em busca de novas descobertas. O disco tem
lançamento hoje, às 21h, no Teatro do Parque. No domingo, o
músico participa de uma tarde de autógrafos na Livraria Cultura
(Paço Alfândega, Bairro do Recife).
A exemplo de sua obra anterior, Loas, lendas e luas
(de 2000, quando o autor ainda assinava como Zé Rocha, sem o “h”
e com acento agudo), Tear é um disco sereno, mais calmo
ainda, que valoriza timbres e nuances de canções
não-convencionais.
Seguindo uma tendência natural de seu tempo, obra e autor
caminham rumo à universalização. Se em Loas... ritmos
como maracatu, ciranda, aboio, baião e samba eram mais
evidentes, curtidos com versos que nos falavam sobre baques
solto e virado, maracatu, coco, Maria Bonita, ciranda, bombo,
batuqueiro, Itamaracá, Carnaval e mamulengo – esse universo tão
diverso quanto esgotável –, em Tear criatura e criador
revivem alguns desses temas, porém, avançam além dos limites
estéticos e conceituais da região.
“A gente está buscando se desapegar mais influência regional,
mesmo que modernista”, explica Zeh Rocha. “Vê que há uma
presença muito forte da cultura popular, desde quando a gente
começou, na época do Flor de Cactus (grupo do qual fez parte
nos anos de 1970), depois valorizado pelo movimento mangue.
Mas hoje quase não uso mais alfaia. Estamos partindo mais para a
world music.”
E o conceito mais atual não se restringe ao que foi
suprimido, mas também ao que foi adicionado. Os arranjos –
assinados pelo talentoso guitarrista Lulu Oliveira, também
produtor e editor do CD – estão cada vez mais ricos e, o que
ganhou de simplificação resultou em mais sofisticação. Vide o
flugel de Fabinho Costa, a percussão de Bruno Vinezof e Rudá
Rocha, e a guitarra e samplers de Jr. Tostoi em Pintou a
tagarela (parceria com Lenine e Erasto Vasconcelos), faixa
que abre o disco, ou a mesma percussão com o trombone de Dió em
Bumba-meu-boi da Boa Hora, ou o violão e castanholas de
Lulu que dão um toque flamenco a Saga de um coração mouro
(parceria com Adriano Marcena).
Lenine, Erasto, Adriano se juntam a outros co-autores, como
Juliano Holanda – que, com Rudá, Bruno e Lulu foram os
principais co-responsáveis por Zeh Rocha encontrar essa
sonoridade que tem Tear –, o próprio Lulu Oliveira, o
poeta paraibano Jessier Quirino e Cláudio Noah, e abrem o leque
da autoria que, em Loas..., ficava mais centrada na
figura do cantor. “Há uma necessidade de começar a olhar o mundo
por outros olhares, outras pessoas”, fala Zeh, que destaca o
talento de Juliano como letrista (aqui, na faixa Lume de
azeite), algo a ser mais trabalhado no futuro.
Artista bem-relacionado na cena da música local, Zeh Rocha
conta com várias participações nesse seu novo álbum. Além de
alguns nomes já citados, há outros facilmente reconhecíveis,
como o maestro Spok, o sanfoneiro Cesinha e o percussionista
Tostão Queiroga. A chancela “participação especial” (no anterior
atribuída a Lenine, Antônio Nóbrega e Zé Renato), contudo, dessa
vez ficou exclusiva para o cantor Geraldo Maia, que contribui
com sua voz em Saga de um coração mouro. “Resolvi mostrar
mais minha cara”, explica Zeh.
SHOW – No espetáculo que faz hoje no Teatro do Parque,
Zeh Rocha interpreta as canções de Tear e de outras fases
da carreira, a exemplo de Festejos (canção da época do
Flor de Cactus), com participação de Publius Lentulus
(Azabumba), e Morena rara, com Geraldo Maia, que repete a
execução de Saga..., que fez no CD.
Os outros convidados do concerto são Lulu Oliveira, que canta
em Xamã (de sua co-autoria, dedicada a Lenine), e Jessier
Quirino, também em suas parcerias – a faixa-título e Secas de
março. Esta última é um poema extraído do livro Prosa
morena, do poeta paraibano, que Zeh pediu para musicar.
Tear, o álbum, tem patrocínio da Chesf e sai com uma
tiragem inicial de mil cópias. Em abril próximo, o compositor
passa duas semanas no eixo Rio de Janeiro-São Paulo para
divulgar seu trabalho e desenvolver uma parceria com o baixista
Papito (Nó em Pingo d’Água, Aquarela Carioca). Espera, em breve,
fechar uma distribuição mais ampla para levar seu Tear
para ainda mais longe.
(©
JC Online, 30.03.2007)