Aos 80 anos, o cineasta Fernando
Spencer sobe hoje ao palco do Cine-Teatro Guararapes
para apresentar seu novo filme Almery, a estrela
ERNESTO BARROS
Especial para o JCO cinema
pernambucano poderia ter sido a maior vedete do Cine
PE - Festival do Audiovisual 2007. As ausências de
filmes que já tiveram passagem em outros festivais,
nacionais e internacionais, como Baixio das
bestas, de Cláudio Assis, e Deserto Feliz,
de Paulo Caldas, só para citar apenas dois exemplos,
certamente elevariam o nível de octanagem da mostra
competitiva de longas.
Apesar de contar com produções
novíssimas do cinema brasileiro, como Não por
acaso, exibido ontem, e Cão sem dono, que
vai passar hoje à noite, o festival deixou um gosto
de quero mais na boca dos cinéfilos que acorreram ao
Cine-Teatro Guararapes, no Centro de Convenções, em
Olinda.
Pelo sim, pelo não, o cinema
pernambucano passa por um momento excepcional e
recebe hoje uma mais do que justa noite de
homenagem, com a exibição de vídeos do projeto
Revelando Brasis e curtas-metragens fora da
competição.
Um dos outorgados com a exibição
especial é o jornalista e cineasta Fernando Spencer
Hartman, que completa 80 anos em plena atividade, a
despeito de enfrentar problemas de saúde -
bravamente vencidos - e dificuldades financeiras
para tocar seus inúmeros projetos. Hoje à noite,
Spencer vai ascender ao tablado do Cine-Teatro
Guararapes para apresentar o vídeo Almery, a
estrela, que ele realizou este ano sob os
auspícios da Fundação Joaquim Nabuco.
Como todo cineasta que se preza
tem sua flor de obsessão, a de Spencer é o Ciclo do
Recife, o período entre a metade da década de 1920 e
início dos anos 1930 que marcou o Estado e a cultura
brasileira com sua intensa atividade
cinematográfica. Mais uma vez, Spencer volta-se para
Almery Steves, a atriz que personificou o ideal de
estrela na aurora do cinema pernambucano.
Em Almery, a estrela, o
cineasta recupera a última entrevista dada por
Almery, em 1981, um ano antes de morrer, e alça-a à
condição de mito da beleza feminina ao entrelaçar
sua imagem, na abertura do vídeo, com a de estrelas
como Greta Garbo, Norma Shearer, Theda Bara e outros
ícones do cinema mudo americano. Almery foi a
estrela de quatro filmes do ciclo: Retribuição
(1924), Aitaré da praia (1925), Dança,
amor e ventura (1927), e O destino das rosas
(1928). Spencer, claro, não se cansa de repetir:
“Almery foi a maior estrela de nosso cinema”.
Antes deste vídeo, Spencer já
dedicara pelos quatro curtas ao Ciclo do Recife, um
deles especificamente sobre Almery Steves e Ary
Severo (que se conheceram durante as filmagens de
Aitaré da praia), intitulado Almery e Ary -
Ciclo do Recife e da vida (1981). Completa a
filmografia: Jota Soares, um pioneiro do cinema
(1981), Memorando Ciclo do Recife (1982),
Estrelas de celulóide (1987) e, em parceria com
Amin Stepple, História de amor em 16 quadros por
segundo (1989).
De um ano para cá, a trajetória de
Spencer vem ganhando um sem números de homenagens.
Depois do DVD Paixão de cinema, que traz 13
filmes de sua autoria e um documentário dirigido por
Marcílio Brandão, Spencer será nome de sala de
cinema. No dia 13 de maio, o Cine Rosa e Silva, nos
Aflitos, abre a Sala Fernando Spencer, dedicada aos
filmes de artes.
(©
JC Online)
Pesquisador
resgata 59 artigos assinados por Jota Soares
Na primeira metade dos 1970, durantes uma das Jornadas da Bahia,
Fernando Spencer e alguns representantes do cinema pernambucano
levaram um pito do crítico e escritor Paulo Emílio Salles Gomes. O
autor de Trajetória do subdesenvolvimento, livro-chave para
se compreender a problemática do cinema brasileiro, disse que os
críticos do Recife não olhavam para o cinema que tinha sido feito
aqui entre as décadas de 1920 e 1930.
Mas, mal sabia Paulo Emílio que Fernando Spencer não medira
esforços para que Jota Soares escrevesse uma série de artigos para o
Diario de Pernambuco, ainda no início da década de 1960. Parte deste
tesouro é agora revelado ao público, não apenas para pesquisadores e
estudiosos, na coletânea Relembrando o cinema pernambucano,
organizado pelo professor Paulo Cunha, da UFPE.
Nos 59 artigos assinados por Jota Soares (alguns são apenas
legendas para fotos), há bastante material para que novas gerações
de pesquisadores lancem um novo olhar para o legado do Ciclo do
Recife. Mesmo que muitos textos lembrem publicações da época, mais
voltados para as notícias do star system local, outros enveredam
pelo lado econômico e estritamente cinematográfico ao sinalizar a
influência do cinema americano nos filmes que eles faziam.
Para explicitar e atualizar a recepção critíca dos textos – e por
extensão os filmes do Ciclo do Recife –, o livro traz ensaios de
Paulo Cunha e Anco Márcio, professor do departamento de Letras da
UFPE.
No ensaio Soares e o Ciclo do Recife, Anco Márcio
questiona a importância dos filmes do ciclo pernambucano na história
do cinema brasileiro. “Acredito que a relevância destes 13 longas
produzidos em Pernambuco, em quase uma década, seja a mesma que
tiveram muitos dos romances, poemas e peças teatrais que, nos anos
30, 40, 50, e 60 dos oitocentos, foram publicados pelos ‘pobres’ e
‘fracos’ escritores referidos por Antônio Cândido”, escreve Cunha.
(©
JC Online)
Curtas seduzem a platéia do Cine PE
SCHNEIDER CARPEGGIANI
Os curtas Cabaceiras (PB), de Ana Bárbara Ramos, e
Noite de sexta, manhã de sábado (PE), de Kleber Mendonça
(crítico de cinema do JC) foram os grandes destaques da noite
de quinta-feira, no Cine PE. A mostra, que lotou o Teatro
Guararapes, sofreu a baixa do curta pernambucano Até o sol
raiá, de Fernando Jorge e Leandro Amorim, que teve problemas de
finalização e não foi exibido.
Cabaceiras foi ovacionado pela platéia do Cine PE por
mostrar um lado longe dos chavões de subdesenvolvimento da cidade
homônima paraibana, considerada a “Roliúde Nordestina”. Por lá, já
foram gravados 18 filmes – o primeiro deles em 1924, o último, O
romance de Tristão e Isolda, de Guel Arraes, em fevereiro
passado.
O documentário colhe depoimento dos moradores de Cabaceiras, que
atuaram como extras nas produções. Todos eles reclamam que os filmes
continuam apostando uma visão seca, pobre e estereotipada do
Nordeste. “Aqui chove pouco, mas nunca falta água”, atesta uma das
entrevistadas, que mais tarde, com uma cabaça nas mãos, diz “por
fora, ela é seca, sem nada, mas se a gente encher ela de balas, de
doces, o exterior é o que menos importa. É assim com a nossa
cidade”.
Cabaceiras é pontuado por uma reportagem do Jornal da
Band, com a chamada “na Hollywood nordestina, a grande estrela é
o bode”, diz o apresentador do telejornal. Ao final do documentário,
a frase “em Cabeceiras, a grande estrela, ao contrário do que disse
o Jornal da Band, é o seu povo”. Mais do que falar de um
município específico, o vídeo de Ana Bárbara Ramos descortina a
imagem construída para o Nordeste desde o início do século passado.
Na hora de apresentar seu curta no palco do Cine PE, Kleber
Mendonça Filho ressaltou que “por mais óbvio que possa parecer,
alguns lugares são bem longe do Recife.” Noite de sexta, manhã de
sábado toma emprestado o título do hino de hedonismo Friday
night, saturday morning, do The Specials.
Se o grupo de pós-punk britânico falava de prazeres noturnos numa
pista de dança proletária, Kleber Mendonça detalha os extremos de
emoção que recaem na humanidade no turbulento espaço de tempo que dá
nome ao curta. Seja numa select em Boa Viagem, ou num balneário
europeu.
A noite contou ainda com as exibições de Rapsódia do absurdo
(GO), de Cláudia Nunes, Chorume (SP), de Hélio Vilela
Nunes, Na Corda bamba (PE), de Marcos Buccini e de Beijo
de sal (RJ), de Felipe Gamarano Barbosa.
(©
JC Online) |