Jornalista pernambucano radicado em São Paulo,
Fernando Portela lança o segundo livro de contos O
homem dentro de um cão
É velha aquela história que divide o mundo entre os
que acreditam em alguma força suprema chamada
Inspiração (com maiúscula, é claro), e os que que
não perdem tempo invocando fadinhas e deuses e se
debruçam num trabalho árduo. Aconteça o que
acontecer. O jornalista e escritor Fernando Portela
é um orgulhoso membro desse segundo grupo. Tanto é
que em 2001 ele se dedicou a uma empreitada
estranha, para dizermos o mínimo.
Muitas vezes cansado da rotina da redação de
jornal onde trabalhava, ele acabava deixando de lado
uma das grandes paixões da sua vida, o fazer
ficcional. Durante seis meses, Portela fez a
promessa que escreveria uma página de ficção por dia
- no mínimo -, não importando as circunstâncias. O
autor se revestiu do pragmatismo que rege o
jornalismo: A página tem de rodar, mesmo que o
repórter tenha a “maldição da página branca” à sua
frente, custe o que custar.
“Comigo não tem isso de página em branco, não.
Tudo é uma questão de esforço. O curioso é que nos
dias mais difíceis, mais atarefados, eu tinha muito
mais assunto para escrever. Eu sempre tive muito
interesse em orientalismo, em budismo, e acredito
que é possível ‘limpar’ a mente. Escrever para mim
era um exercício de limpeza dos meus pensamentos”,
lembrou.
O primeiro livro desse esforço - Allegro -
saiu há três anos, com 91 textos. O segundo, O
homem dentro de um cão, foi lançado no começo
deste ano. A idéia do autor é que sua declaração de
liberdade em relação à inspiração (e a qualquer
outra mitologoia cercando o ato de escrever) resulte
numa “trilogia”, em que o importante não é o tema,
mas a motivação.
Radicado em São Paulo, o pernambucano retorna
hoje ao recife para lançar O homem dentro de um
cão. A noite de autógrafos rola, às 19h, no Bar
Seu Cafofa. Com selo da editora Terceiro Nome, o
romance foi um das escolhidas pelo júri do Programa
de Ação Cultural (PAC), da Secretaria Estadual de
Cultura de São Paulo no final do ano passado. “Este
programa(PAC) é um estímulo muito importante para a
política cultural brasileira e traz a possibilidade
real de um autor vir a publicar sua obra”, explica.
Apesar de ter se especializado em publicidade, é
estreita a relação de Portela com o jornalismo. Ele
foi um dos fundadores do Jornal da tarde, de
São Paulo, onde trabalhou boa parte de sua vida como
jornalista, sempre que possível procurando levar um
pouco da liberdade literária para o rigor da
imprensa. Em outro período, foi responsável pela
comunicação do grupo Fiat. Embora tenha atuado por
toda a vida como jornalista, Portela se deu conta,
em determinado momento, que a sua essência é a
ficção.
“Desde pequeno, eu gostava de inventar história,
numa época em que escrever era uma atividade muito
mais marginal do que hoje em dia. Primeiro fui
estudar psicologia, depois publicidade. Com o golpe
militar de 64, as coisas ficaram delicadas no
Recife, então fui para o Rio de Janeiro, depois para
São Paulo, onde participei das inúmeras edições de
número ‘zero’ do Jornal da tarde”, lembrou.
Esse contato inicial com a imprensa foi uma
armadilha: de um estágio na redação de jornal, para
a vida inteira fazendo reportagens. Dessa
experiência, Portela leva uma máxima que inverte a
lógica de muitos aspirantes à literatura: “A redação
de jornal não é um lugar legal para quem quer ser
escritor. O texto do jornal prende muito você. Nas
minhas matérias, eu não podia criar histórias, tinha
de ser coerente com a realidade. Acho que para quem
deseja criar, a publicidade é um exercício bem mais
interessante”, sugere.
Atualmente, Portela resolveu deixar de vez a
redação de jornal. Trabalha, atualmente, como
escritor profissional, em livros que exigem mais uma
vez a precisão do repórter. Seu mais recente
trabalho nessa área é uma obra em que desvenda os
mitos cercando os fatos históricos.
Ainda assim, sua grande paixão continua sendo a
literatura propriamente dita, bem longe das
restrições jornalísticas que acompanharam a sua
vida. Por isso, talvez, muitas das histórias de O
homem dentro de um cão comecem banais e
explodam, no final da trama, para longe de qualquer
amarra da realidade.
O azulejo na arquitetura religiosa de Pernambuco é o título da
publicação que reúne textos da arquiteta Sylvia Tigre e fotos de
Alex Salim
OLÍVIA MINDÊLO
Mais do que o registro de um patrimônio cultural do Estado, o
livro O azulejo na arquitetura religiosa de Pernambuco – séculos
XVII e XVIII, com lançamento hoje, às 19h, na Faculdade Damas, é
um convite a um passeio pelas igrejas, capelas, conventos e museus
pernambucanos. Pertinho de nós, são locais que escondem e ainda
preservam, de alguma maneira, um dos bens mais belos e preciosos que
Portugal trouxe ao Brasil: a sua azulejaria, que, em nosso País,
ganhou formas e desenhos peculiares.
Quem assina o trabalho é arquiteta Sylvia Tigre de Hollanda
Cavalcanti, autora também do primeiro documento do tipo, O
azulejo na arquitetura civil de Pernambuco – século XIX,
publicado em 2002. De acordo com ela, a idéia de fazer os dois
livros veio na mesma época, mas acabou optando por investir primeiro
na pesquisa dos azulejos civis, em casas e prédios, porque estavam
muito mais deteriorados, devido, sobretudo, à ação de vândalos, que
retiram das fachadas as peças seculares. “Se eu fosse fazer este
livro hoje em dia, eu não faria mais. Tiraram tudo, principalmente
na Boa Vista”, diz a autora das publicações.
Para ela, os azulejos dos espaços religiosos pelo menos estão
tombados e mais protegidos, apesar de ainda carecerem bastante de
manutenção e recuperação. Este é, aliás, o maior problema que
enfrenta hoje o legado azulejar das ordens religiosas das seis
cidades pesquisadas pela arquiteta – Recife, Jaboatão dos
Guararapes, Olinda, Igarassu, Camaragibe e Sirinhaém. Conforme conta
no livro, o motivo para a azulejaria se concentrar no litoral
brasileiro se deve ao fato de o colonizador ter tido dificuldade de
transportar para o interior um material tão frágil. “A azulejaria
religiosa é completamente diferente da civil. A civil é de
repetição, ou seja, tem o mesmo padrão, o que muda o desenho é a
forma como os azulejos são arranjados e colocados – pode ser 2 x 2,
ou 4x 4. Já os religiosos são, no geral, painéis, e em alguns casos,
principalmente no século 17, são tapetes (ambos mais complexos)”,
explica a autora, que conferiu à edição de arte sacra um toque
nobre, com capa dura e formato quadrado, em alusão à geometria dos
azulejos, porém ampliado em relação ao tamanho padrão.
A publicação é composta por mais de 160 fotografias, clicadas por
Alex Salim. O tratamento das imagens, é verdade, está aquém do
conjunto da obra, mas não compromete o foco de Sylvia: o registro
documental, que traz uma gama de detalhes e informações tão caros à
história da azulejaria pernambucana, e brasileira como um todo. “Eu
acho que meu livro contribui para educar, mostrando que se trata de
um bem cultural que merece respeito e admiração”, pontua a autora.
Sobre o bem cultural presente nas páginas de O azulejo na
arquitetura religiosa de Pernambuco, há predominância da
azulejaria azul barroca, que corresponde ao período que vai do
século 17 até meados do 18. Nela, temas religiosos, relativos à vida
de Jesus, a anjos e a santos padroeiros das respectivas ordens são
os mais comuns. “O emprego exclusivo do azul representava para os
mestres azulejeiros uma grande simplificação: em vez de trabalhar
com vários óxidos, bastava-lhe agora apenas o cobalto. Era só
colocar mais ou menos óxido, conforme as nuances pretendidas, e
estava resolvida a execução da peça”, escreve Sylvia em seu livro.
As curiosidades do conteúdo, no entanto, vão além do azul como cor
predominante, que também sofreu, na Europa, influência da estética
do porcelanato chinês.
Nos três principais capítulos de sua publicação, uma edição
bilíngüe (português e inglês), a arquiteta faz um passeio minucioso
pelo legado azulejar do Estado, presente nas fachadas e nos
interiores dos ambientes sacros. Paredes, lavabos, cúpulas, naves,
abóbodas e até a parte frontal do altar, como acontece, unicamente
no Brasil, com a Capela de Nossa Senhora da Piedade, são exemplos de
detalhes arquitetônicos onde a herança colonial foi aplicada. Um dos
casos mais impressionantes é o da Igreja de Nossa Senhora dos
Prazeres, em Jaboatão dos Guararapes. A casa da Ordem Beneditina não
ostenta a riqueza dos painéis barrocos, mas apresenta azulejos
ornamentados (de repetição) belíssimos, ocupando praticamente toda a
parede da nave da igreja.
Interessante é a participação do Convento de Santo Antônio, em
Sirinhaém, no Litoral Sul do Estado. Como a Capela Nossa Senhora da
Conceição (na Jaqueira), por exemplo, o convento é ladeado por
painéis recortados no topo, que vão do chão à metade das paredes
laterais da nave.
Ao todo, a autora percorre, no livro, as características de cinco
igrejas, cinco conventos, três capelas, um seminário (Olinda) e duas
antigas moradas episcopais (Museu de Arte Sacra e Museu Regional,
ambos em Olinda).
Lançamento do livro O azulejo na arquitetura religiosa de
Pernambuco – séculos XVII e XVIII (Metalivros, 180 páginas).
Preço médio do livro: R$ 96 (nas livrarias)