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Batuque de Naná faz 50 anos

11/06/2008

 
Naná Vasconcelos tinha 12 anos quando tocou pela primeira vez profissionalmente, em 1956, num hoje extinto clube de Sítio Novo, Olinda

JOSÉ TELES

Pierre (manola), Nicodemis (baixo acústico), Cilinho (acordeom), Berto (bateria), Zé da Gaita (clarinete), Zezinho Abacaxi (maracas), Juvenal (bongô). Com esta formação, o conjunto animou o soirée dançante no Clube Metralha, em Sítio Novo, Olinda. Era a estréia de Juvenal, filho de Pierre, na época com 12 anos. Alguns parentes foram assistir ao pequeno Naná (seu apelido) tocar. Entre eles, o irmão Erasto, então com nove anos. “Eu não podia entrar no Metralha. Vi por cima do muro, nos ombros de Wilson, um amigo da família. Recordo ainda a primeira música: Siboney (clássico cubano de Ernesto Lecuona)”, testemunha o também percussionista Erasto.

Meio século depois, Juvenal, ou melhor Naná Vasconcelos, diz que prefere se pensar com 62 anos de idade (completados hoje) do que com 50 de carreira, durante os quais voou do lendário Batutas de São José, na Rua da Concórdia, ao Blue Note em Manhattan. Da gravadora Rozenblit (onde acompanhou músicos locais, e até o cubano Bievenido Granda) até os mais sofisticados estúdios americanos e europeus, dividindo discos com ídolos da adolescência, Don Cherry ou Jack DeJohnette. Aliás foi por causa de Naná, e Airto Moreira, que a revista Downbeat, a bíblia dos jazzófilos, instituiu a categoria “percussionista”. E Naná foi eleito oito vezes o melhor percussionista. “Antes de mim, Airto, existia o ritmista, o tocador de bongô, de tumbadora. Com a gente começou o percussionista, o cara dos vários instrumentos percussivos, que inventa ritmos”, comenta Naná, que se descobriu músico muito cedo.

“Desde pequeno eu vivia batendo nas panelas da cozinha. O jeito foi minha mãe deixar que meu pai me levasse com ele para os lugares onde tocava. Dona Petronila e seu Pierre (que tocava cavaquinho e manola, um violão de quatro cordas, eletrificado) precisaram de uma autorização do Juizado de Menores para que Naná tocasse na noite: “Eu podia entrar nas gafieiras, nos clubes, até nos cabarés, mas só não podia descer do palco. Minha rotina foi totalmente diferente da dos meus irmãos. Ia tocar nos sábados com meu pai e chegava em casa às quatro da madrugada. Dormia até meio-dia, e à tarde ia tocar nas matinês”, lembra Naná, rindo.

Seu instrumento na época em que no Brasil imperavam o bolero, o chá-chá-chá, a rumba, era bongô ou maracas. A bateria veio por influência do jazz, que escutava sintonizando o rádio na Voz da América, que mesclava a propaganda norte-americana com o jazz de Dave Brubeck, John Coltrane, Duke Ellington. Com o dinheiro amealhado nas noitadas e matinês, comprou uma bateria, que lhe abriu caminho para participar de grupos de samba jazz, no início dos anos 60. Com o primeiro deles, o Quarteto Yansã, fez show e gravou disco em Portugal. A bateria também o fez conhecido na então cultural e politicamente efervescente Recife. Época do MCP e dos grupos de teatro engajado. Na peça Memória dos cantadores ele descobriu,o berimbau: “Tirei o berimbau da capoeira e fiz dele um instrumento solo”, diz, sem falsa modéstia. Realista comenta que a imensa obra que acumulou nesses 50 anos não teria existido se não tivesse tomado a decisão de sair do Recife, em 1967 (com passagem patrocinada por Capiba), e do Brasil, em 1970. Virou cidadão do mundo. Mas, como diz Gilberto Gil, em Back in Bahia “Como se ter ido fosse necessário para voltar “. Em 1997, Naná Vasconcelos voltou a morar no Recife, com a mulher Patrícia e a filha Luz Morena, leonina como ele: “Hoje a tecnologia permite que eu continue trabalhando aqui e lá fora”, explica Naná, que acaba de chegar da Turquia, onde acrescentou mais um álbum à uma discografia cujos títulos já passam de uma centena.

(© JC Online)

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