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Música em movimento

11/06/2008

O cantor e compositor Lula Queiroga

Bandas pernambucanas apostam em videoclipe como uma forma mais forte de divulgação de seus trabalhos, mas esbarram nas dificuldades financeiras

CONCEIÇÃO GAMA

A geração musical pós-mangue veio acompanhada por uma efervescência cinematográfica no Estado, fruto da revolução digital que barateou o custo dos equipamentos de vídeo. Para qualquer banda pernambucana que se preze, hoje, gravar um videoclipe é quase tão importante quanto gravar um disco.

“O videoclipe é um meio de divulgação fundamental atualmente. Podemos disponibilizá-lo na Internet para qualquer pessoa ver. Quando resolvemos fazer um videoclipe, entramos em acordo com o diretor e dividimos o roteiro, para que o vídeo fique com a cara da banda. Apesar das dificuldades, não podemos deixar de filmar”, conta Rogerman, vocalista da Bonsucesso Samba Clube, banda que tem quatro clipes gravados e dois discos lançados. O cantor e compositor Lula Queiroga, com dois discos lançados, três clipes prontos, mais um em fase de finalização e um DVD ao vivo em edição, concorda com Rogerman. Segundo ele, o videoclipe cria uma identidade visual que complementa a identidade musical do artista. “O clipe mostra para que o artista veio. Ele conta uma história que às vezes vai além do que a música fala”, conta.

O diretor Nilton Pereira, cineasta da produtora TV Viva, organização não-governamental ligada ao Centro de Cultura Luiz Freire, afirma que a revolução digital trouxe uma maior democratização da mídia vídeo. “Uma Betacam, na época que nós compramos, há 15 anos, por exemplo, custava 45 mil dólares. Hoje você compra uma boa câmera digital com 5 mil dólares. As tecnologias atuais baixaram os custos e facilitaram a vida de todo mundo”, comemora.

Mas nem tudo são flores. O acesso mais fácil aos equipamentos de vídeo não veio acompanhado de uma estrutura no Estado que possibilite a realização de grandes produções. “Aqui no Recife não há uma infra-estrutura de cenários para cinema. A gente tem uma cena musical mais avançada que a produção de videoclipes. Nos últimos anos houve um aumento no número de produções, mas elas ainda são, na maioria, semiprofissionais. Em cinema há uma certa tradição por aqui, mas em videoclipe ainda não. E isso não acontece por falta de competência, mas por falta de dinheiro mesmo”, argumenta Pedro Severien, que faz parte da nova geração de diretores do Estado.

Outro diretor da nova geração, Daniel Aragão, concorda com o fato de haver dificuldades na realização de videoclipes em Pernambuco. “Todo mundo aqui faz clipe praticamente de graça. Apesar de o Estado ter expressão artística na área do audiovisual, especificamente a mídia videoclipe é apenas mais uma forma de se fazer. Videasta recifense é muito ansioso por trabalho e daí termina fazendo tudo”, confessa. Daniel assina a direção dos clipes Além da razão (2005), da banda Rádio de Outono, É o tchan da garrafa (2005), da Profiterólis e a fotografia de Deixe-se acreditar (2006), da Mombojó. Ele ganhou o prêmio de melhor videoclipe no Festival de Gramado 2005 com Ireny, da Mula Manca & A Triste Figura, clipe em que dividiu a direção com Gabriel Mascaro.

Marcelo Pinheiro, da Luni Produções, também vê de perto as dificuldades de realização. “Aqui dificilmente se roda em 16 mm. Sou sempre procurado por bandas, muitas vezes bandas boas e por que eu me interesso, mas elas não têm dinheiro, aí fica complicado. Com o apoio total de uma produtora, o artista precisa desembolsar 6 ou 7 mil reais no mínimo para fazer um clipe legal”, afirma. Marcelo dirigiu, dentre outras realizações, Propróstata, da Textículos de Mary, que foi indicado como melhor clipe ao Video Music Brasil 2003, premiação da MTV. O clipe mais recente assinado por Marcelo é Nas terras da gente, de Silvério Pessoa, lançado há um mês, e tem co-direção de Jeanine Brandão.

Não é por causa da falta de estrutura que se deixa de experimentar novidades nas produções dos videoclipes pernambucanos. Raul Luna, que dirigiu Cabidela (2003), da Mombojó, O lago (2004), da Superoutro e Marchinha (2005), da Parafusa, é um nome forte da nova geração de diretores de videoclipe, que abusa da criatividade para driblar as dificuldades de baixo orçamento. “Estou filmando o clipe da música Dreams, da Mellotrons e um DVD inteiro da Superoutro, com clipes de singles e experimentos. Antes eu acreditava que se usasse o melhor equipamento teria o melhor vídeo. No entanto, hoje eu observo que vale mais a qualidade conceitual do que a técnica em si. Para o clipe da Mellotrons, por exemplo, estou usando uma câmera de VHS, ultrapassada e buscando a estética dos anos 90. Experimentar é sempre válido”, conta.

(© JC Online)


 


Depois do sucesso, vem o Sudeste

Artistas pernambucanos que ganharam renome nacional nos anos 90 deixaram de produzir clipes em Pernambuco no auge da carreira

A produção de videoclipes em Pernambuco teve um boom no início dos anos 90, com trabalhos produzidos de forma independente. No entanto, a partir do momento em que os artistas assinaram com grandes gravadoras, deixaram de realizar os videoclipes no Estado e passaram a produzir os vídeos no eixo Rio-São Paulo. “No início dos anos 90, o Manguebeat englobou várias áreas artísticas e havia uma efervescência do movimento. Conhecíamos as bandas e fazíamos os clipes de graça porque acreditávamos nelas. Quando elas assinavam com uma gravadora, esperávamos que fossem continuar gravando com a gente, com financiamento e uma estrutura melhor. No entanto, as gravadoras tiraram o trabalho da gente e fizeram os clipes dos artistas pernambucanos no Sudeste”, conta o cineasta Kléber Mendonça Filho.

A Mundo Livre S/A é uma das bandas que se encaixam nesse perfil. “Fizemos alguns democlipes com a TV Viva, antes de fecharmos com a gravadora. Depois todos os nossos clipes foram feitos em São Paulo. Em 2003 saímos da gravadora e lançamos O outro mundo de Manuela Rosário, completamente independente e sem orçamentos para clipes. Aí liberamos as músicas para quem quisesse fazer clipe. Recebemos trabalhos do Brasil todo, foi muito gratificante”, comemora Fred 04, vocalista da banda.

O único clipe do álbum feito em Pernambuco foi produzido pela TV Viva. O outro mundo de Xicão Xucuru, dirigido por Nilton Pereira, é de música composta por Fred 04 a partir de um documentário produzido pela ONG. “Aqui no Recife nunca tivemos uma exibição tão grande como aconteceu com Xicão Xucuru, que passou várias vezes na TVU. Do vendedor do fiteiro ao motorista de táxi, todo mundo veio falar com a gente dizendo que viu o clipe”, afirma Fred 04.

Com o novo álbum, Bebadogroove, a banda deu continuidade à experiência de clipe genérico. Em Pernambuco estão sendo realizados dois videoclipes do disco, Carnaval inesquecível na Cidade Alta e Laura Bush tem um senhor problema, ambos dirigidos por Pedro Severien. “Quando pensamos nos clipes, queríamos qualidade de produção para que eles entrassem no circuito. Elaboramos então um orçamento para filmagens em Super 16. Conseguimos 45 mil da Chesf e 25 mil da Prefeitura do Recife, mas o orçamento mesmo era de 88 mil. Teremos algumas dificuldades, mas sai”, conta Pedro. As filmagens dos dois videoclipes serão realizadas no fim do mês. (C.G.)

(© JC Online)


Animação também em Pernambuco

A digitalização dos vídeos trouxe aos artistas pernambucanos, além da praticidade, a possibilidade de trabalhar com outras técnicas de imagem, como a animação. Marcelo Vaz, da produtora Z-4, é um dos diretores que trabalham com a técnica em Recife. Ele dirigiu o clipe de Cidade cinza, da banda Astronautas, uma animação em 3D, com uma linguagem de filme futurista. A produção rendeu a Marcelo a indicação de melhor clipe no Video Music Brasil 2005.

Ele também dirigiu Sabe tudo, da Rádio de Outono, uma animação em 2D, com uma estética inspirada nos desenhos da Cartoon Network, e A história do Boi Tatau, da Parafusa, um mix de vídeo, fotografia e animação. “Os clipes de animação são feitos basicamente com PC e estúdio. Pensamos em tudo para ficar bem feito.

Hoje em dia é muito fácil fazer um videoclipe, o problema maior é manter a qualidade”, argumenta. Segundo Marcelo, o orçamento de um clipe de animação fica em torno de cinco e dez mil reais. (C.G.)

(© JC Online)


Misturar música e vídeo não é novidade no Recife

Os primeiros esboços de videoclipe que apareceram no Recife ainda na década de 70. Em 1975, a banda Ave Sangria gravou uma espécie de vídeo performance da música Geórgia, a carniceira para o programa Fantástico, da Rede Globo. No entanto, o material nunca foi exibido. “Gravamos a música num cenário em estúdio. A produção foi toda da Rede Globo. Para a gente era só aparecer na TV mesmo, não tínhamos esse conceito de videoclipe em mente”, conta Marco Pólo, ex-vocalista da banda.

O cantor Alceu Valença também fez alguns experimentos com vídeo na década de 70. “A imagem sempre esteve ligada à minha pessoa. Música, para mim, sugere cinema”, explica. Em 1973, Alceu fez A noite do espantalho, um filme-clipe dirigido por Sérgio Ricardo, em Nova Jerusalém. Mais tarde, o cantor vivenciou outras experiências com vídeo, dessa vez dirigido por Jomard Muniz de Brito. “Fizemos uma filmagem em Super 8 produzida com a música Imitação da vida, no Morro da Conceição, no final da década de 70. Na época não se falava em videoclipe, foi um trabalho experimental, amadorístico. Depois, no começo dos anos 80, fizemos, junto com Rucker Vieira, Amanhecendo, um semidocumentário livre sobre um disco inteiro. Alceu aparece às 5h da manhã em uma fábrica na Torre e depois faz um passeio pela cidade. Foi um trabalho de registrar e reinventar o Recife”, afirma Jomard.

Outra embrião de videoclipe no Recife foi realizado em 1984. O jornalista Amin Stepple Hiluey dirigiu um vídeo musical produzido pela Rede Globo, Edy Clínio, o conde do rock, um curta-metragem com sete minutos de duração. “Ele era uma figura que fazia shows pela cidade. Em vários muros do Recife havia pixado ‘Edy Clínio, o conde do rock’, mas ninguém sabia ao certo quem era ele. Eu trabalhava na Globo na época e tive a idéia de fazer o vídeo, que foi exibido no telejornal local. Foi, na verdade, um projeto experimental em que utilizei várias técnicas diferentes como videoclipe, cinema, udigrudi, telejornalismo, vídeo-arte e super 8”, explica Amin. (C.G.)

(© JC Online)


MTV ainda é objetivo das bandas

Aparecer na MTV para uma banda de hoje é tão importante quanto ter músicas tocando nas rádios. Isso porque a emissora tem ajudado a formar o gosto musical de grande parte da juventude e as bandas sentem a necessidade de fixarem a sua imagem perante o público.

“Músico é muito vaidoso. Por mais que o clipe tenha sido feito de forma independente, as bandas se comportam como se tivessem se vendendo, com a intenção de entrar na MTV e outros canais comerciais”, conta o diretor de clipes Daniel Aragão.

Bárbara Jones, vocalista da Rádio de Outono, concorda com o diretor. “A MTV hoje é como o rádio antigamente. As pessoas que não têm curiosidade de procurar coisas novas, que querem receber as músicas já prontinhas, embaladas, formam o seu gosto musical a partir da emissora”, afirma. Segundo Bárbara, depois que o clipe de Sabe tudo estreou na MTV, o retorno do público foi muito significativo. “Recebemos e-mails de gente do Brasil inteiro elogiando o clipe”, conta.

A banda Mundo Livre S/A deve boa parte do seu sucesso nacional à emissora. “Somos os únicos artistas de Pernambuco a figurar o primeiro lugar do Disk MTV, com o clipe de Livre iniciativa, em 1994. Na época não existia jabá na TV, a MTV era uma coisa de quem era apaixonado por música. Os VJs eram críticos de música, não modelinhos”, afirma. Fred conta que chegar ao topo não foi tão simples. “Estávamos no auge da carreira. Havíamos sido escolhidos como artista revelação pela revista Show Bizz. Então Titi, o filho do dono da MTV, nos convidou para fazer o clipe. Para a nossa sorte, tivemos esse apadrinhamento”, revela.

Outra banda pernambucana que conseguiu sucesso nacional por meio da MTV foi a Paulo Francis Vai Pro Céu. O clipe da música Perdidos no espaço ganhou o prêmio de melhor democlipe no Video Music Brasil 1998. “As pessoas não acreditavam que a gente ganharia o prêmio porque bandas de Recife não ganhavam. Foi uma surpresa para todo mundo. Até hoje somos os únicos pernambucanos premiados no VMB”, conta André Balaio, vocalista da banda. No entanto, segundo Balaio, a banda não soube aproveitar o sucesso que chegou junto com a premiação. “Sem dúvidas o clipe ajudou muito a divulgar nosso trabalho. Fechamos vários shows no Rio e em São Paulo. Mas depois a banda ficou um tempo parada e acabou um tanto esquecida”, lamenta. (C.G.)

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Fazer uma produção caseira é mais fácil do que parece

Hoje, para fazer um vídeo, não é necessário sequer ter uma câmera filmadora. E, para divulgá-lo, é apenas necessário ter acesso à Internet. A estudante de Radialismo e TV da Universidade Federal de Pernambuco, Sofia Egito, provou isso ao realizar o clipe da música Space bolero, da banda Asteróide B-612, todo com fotografias digitais. Ela disponibilizou o vídeo no site Google Videos e enviou uma cópia para a MTV, que o exibiu no programa Ya! Dog.

“Não foi difícil de fazer. O clipe levou quatro dias para ficar pronto. Foram dois dias para a sessão de fotos e mais dois dias para a edição. Editei as fotos no meu computador de casa mesmo e a edição do vídeo fiz numa ilha de uma universidade particular”, conta.

Sofia gostou tanto da experiência que pretende levá-la adiante. “Quero comprar uma câmera e equipar meu computador pessoal para poder fazer edições em casa. Sei que é um mercado que está crescendo”, vibra. (C.G.)

(© JC Online) 

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