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Brilho eterno para o Ouro Negro

11/06/2008

Agliberto Lima/AE

O músico em 2005, em SP, no lançamento de seus songbooks


Maestro dos maestros, o saxofonista pernambucano Moacir Santos morreu aos 80 anos, nos Estados Unidos, onde vivia desde os anos 60

MARCOS TOLEDO

Dois paralelos que se encontram em um infinito brilhante. Assim pode ser definida a vida e obra do saxofonista, compositor, arranjador, professor e maestro pernambucano Moacir Santos, que morreu no último domingo, nos Estados Unidos, após sofrer um segundo derrame. Apesar de tudo, as homenagens recentes e dos prêmios e resgates de seu trabalho, ainda é pouco para o talento do “maestro dos maestros”, como ficou conhecido.

Os paralelos consistem na dicotomia que foi a vida de Moacir Santos: a do menino pobre, órfão e inconformado – não raro, vítima do preconceito racial – que partiu para o mundo em busca de um ideal, e a do gênio precoce e autodidata que se tornou um dos grandes nomes da música instrumental internacional.

Nascido em Vila Bela (atual Serra Talhada) e criado em Flores do Pajeú, Moacir foi um dos muitos jovens que tiveram como primeira fonte musical a banda de música do interior. Vivenciou a humildade de apanhar pedaços de taboca para fazer pífanos e, nos intervalos da banda de Flores, experimentava cada um dos instrumentos – aprendeu a tocar todos. Só depois, teve seu professor, o Mestre Paixão.

Já experiente, fez a rota tradicional dos instrumentistas da época, a era do rádio: Recife-Rio de Janeiro (com uma breve “conexão” em João Pessoa). No Rio, foi aluno de Guerra-Peixe e Hans Joachim Koellreuter e professor do também saxofonista (e clarinetista) Paulo Moura, do violonista Baden Powell, do percussionista Airto Moreira, do pianista João Donato e da cantora Nara Leão.

Como uma coisa leva à outra, fez em 1963 os arranjos do LP Vinicius de Moraes & Odete Lara. Depois, foi convidado para compor a trilha de Ganga Zumba, de Cacá Diegues (já havia feito a trilha de Os fuzis, de Ruy Guerra). Moacir havia acabado de lançar seu primeiro álbum, Coisas (1965), quando participou da trilha do filme americano Amor no Pacífico, e ganhou uma passagem do Itamaraty para ir aos Estados Unidos para onde, dois anos mais tarde, se mudaria definitivamente.

A vida do compositor foi uma reação em cadeia, um verdadeiro efeito borboleta. A partir de então, foi descoberto pelo célebre pianista Horace Silver (cujo pai era português) e gravou quatro discos nos EUA, três deles pelo lendário selo Blue Note (uma indicação ao Grammy Awards por The maestro), passou a ser membro da American Society of Composers Authors and Publishers (Ascap) e da Music Teachers Association of California (MTAC).

Uma trajetória bem-sucedida, contudo, muitos músicos talentosos e competentes podem alçar. Mas com Moacir foi diferente. Sua obra está muito além do que foi feito até então no gênero: uma mistura perfeita da música afro-brasileira com a afro-americana, sem precedentes em termos de melodia, ritmo e harmonia.

O gênio da música se distanciou tanto daquele garoto pobre de Flores do Pajeú que, por muito tempo, acabou esquecido em sua própria terra. Nem tanto no Brasil – foi atração do primeiro Free jazz festival (1985), e homenageado na edição de 2001, e teve seu trabalho revisitado em coletâneas-tributo, DVD e songbook –, mas principalmente em Pernambuco, que só lhe prestou homenagem há dois anos, concedida pela Assembléia Legislativa durante o lançamento do biografia Moacir Santos: o ouro negro do Pajeú, da jornalista Marilourdes Ferraz. Ainda assim, veio com recursos próprios.

(© JC Online)


Produtores tentam lançar álbuns americanos

Quando esteve no Recife em fevereiro de 2004, Moacir Santos aparentava fragilidade, ainda em conseqüência do primeiro derrame que sofrera, nos anos 90. Em tempo, produtores como João Nogueira e Mário Adnet conseguiram viabilizar projetos que trouxeram de volta à memória do País o talento e a obra do maestro. A próxima meta a ser alcançada é o lançamento no Brasil dos álbuns gravados pelo compositor nos Estados Unidos.

Paralelamente, os tributos desencadeados nos últimos anos, continuam em forma de prêmios, discos, songbooks e DVD. O Prêmio Shell de música 2006, dedicado no último dia 19 (exatamente uma semana antes do artista completar 80 anos de idade) por unanimidade, será entregue em novembro a Moacir Santos Filho.

O lançamento nacional dos álbuns The maestro, Saudade, Carnival of spirits e Opus 3 nº1 chegou a ser divulgado pela imprensa. Porém, de acordo com o produtor Mário Adnet, ainda há uma dificuldade em relação a patriocínio.

Atualmente, é possível encontrar três discos do compositor no mercado: o duplo Ouro negro, que conta com temas de todos os seus LPs anteriores, e tem a participação de Milton Nascimento, Djavan, Ed Motta, Gilberto Gil, João Bosco, Joyce e João Donato, entre muitos outros, Choros & alegria, com choros e canções que o autor tinha apenas de memória, e Coisas, seu primeiro trabalho, de 1965, recém-relançado.

Outras obras disponíveis sobre o músico são o DVD Ouro negro – que, com Choros & alegria, lhe valeu o Prêmio TIM este ano – e a série de songbook Cancioneiro Moacir Santos. (M.T.)

(© JC Online)


Adeus ao mestre e maestro Moacir Santos

O grande maestro, compositor, arranjador, professor e saxofonista, morreu no domingo, aos 80, em Pasadena, Califórnia (Estados Unidos), em conseqüência de um segundo derrame cerebral

Lauro Lisboa Garcia

SÃO PAULO - Moacir Santos não tinha influências porque era a fonte. Esta frase do saxofonista Zé Nogueira sintetiza a dimensão da obra do grande maestro, compositor, arranjador, professor e saxofonista, que morreu no domingo, aos 80, em Pasadena, Califórnia (Estados Unidos), em conseqüência de um segundo derrame cerebral. O primeiro ele sofreu nos anos 90 e deixou seqüelas, impedindo o músico de tocar.

Os últimos anos foram intensos na vida de Moacir em relação ao Brasil, país em que demorou a ser reconhecido (e talvez não tenha sido a contento) e de onde partiu em 1967 para morar nos EUA, onde será enterrado.

No dia 18 de julho passado, uma semana antes de completar 80 anos, Moacir foi contemplado com o Prêmio Shell de Música, pelo conjunto de sua obra. Desde 2001, quando os músicos Mário Adnet e Zé Nogueira reuniram a nata dos instrumentistas brasileiros contemporâneos para gravar o CD-tributo "Ouro Negro", a obra do grande maestro começou a se tornar mais acessível a seus conterrâneos.

Até então todos os seus discos estavam fora de catálogo no País. Depois disso, só "Coisas" (1965), uma bíblia da negritude para muitos músicos, como Ed Motta, foi relançado. Há procedimentos de composição, harmonia, divisão, orquestração e variedade rítmica que o situam no pódio ao lado de gigantes como Duke Ellington, Miles Davis e Dizzy Gillespie. O tema de nº 5, rebatizado de "Nanã", se tornou popular depois de ganhar letra de Mário Telles.

(© Agência Estado)


Músicos falam sobre o legado de Moacir Santos

Gilberto Gil, Ed Motta, Mário Adnet, entre outros, falam sobre a importância do maestro que morreu nos Estados Unidos

SÃO PAULO - O grande maestro, compositor, arranjador, professor e saxofonista, morreu no domingo, aos 80, em Pasadena, Califórnia (Estados Unidos), em conseqüência de um segundo derrame cerebral. O primeiro ele sofreu nos anos 90 e deixou seqüelas, impedindo o músico de tocar. Teve uma enorme influência sobre muitos outros grandes nomes da música brasileira. Nascido no sertão pernambucano e criado no Recife, o maestro morava há muitos anos nos Estados Unidos, onde será enterrado.

Gilberto Gil, ministro da cultura - “Moacir Santos foi, sem dúvida, uma das personalidades musicais mais importantes do país. Sua sofisticação melódica e harmônica, sua criatividade e sua capacidade magistral de traduzir o erudito no popular marcaram a história da música brasileira. Por ele o Brasil foi de todos os santos. Por ele o negro foi ouro e expressão. Por ele fomos tanto mais do que somos. Salve Moacir de todos os Santos”.

Ed Motta, cantor e compositor - “O que sinto é diverso: um misto de saudades e de revolta. Revolta por o Brasil demorar tanto para reconhecer os seus talentos. Moacir Santos, sem dúvida, é um dos mais importantes e brilhantes músicos que fez a fusão entre a música africana e européia. Com certeza ele será recebido no paraíso por Duke Ellington com tapete vermelho estendido. Era uma pérola rara.”

Mário Adnet, violonista e compositor - “Era quase um pai para mim, com tudo que essa relação tem de coisa boa, de dificuldade. Foi muito bacana tê-lo conhecido”

Joyce, cantora - Sinceramente, acho que o Moacir Santos teve uma vida linda, um autor de uma obra maravilhosa, teve um casamento feliz e ainda obteve o reconhecimento, no Brasil, ainda em vida de seu trabalho. Ele estava meio esquecido por aqui e teve sua obra regravada, fez shows. Missão mais do que cumprida.”

Nei Lopes, cantor e compositor - Escrevi cinco letras para canções do Moacir e, por incrível que pareça, só o vi uma única vez em uma apresentação que fez no Teatro Municipal do Rio, em 2001. Lamento muito não ter tido um contato mais próximo, que poderia ter se transformado numa grande amizade entre nós. Moacir Santos foi o maestro dos maestros. Estudou com Koellreuter e Radamés Gnattalli, e no entanto não perdeu a africanidade em suas composições.”

(© Agência Estado)

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