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 A aventura maquinada da guitarra da Nação Zumbi

 

Divulgação

 Lúcio Maia (ou maquinado): disco solo de estréia traz um guitarrista contido e experimentações que remetem à Nação Zumbi
 

Lúcio Maia lança o projeto paralelo Homem Binário, com a colaboração de seu parceiro de banda Jorge Du Peixe, de Siba e outros do mesmo naipe

Flávia Guerra

Há quase um ano, em um dos tantos divinos inferninhos de São Paulo, o Sarajevo, Lúcio Maia reuniu fãs e chegados para apresentar sua mais nova 'ação entre amigos', na melhor acepção da palavra: Maquinado (Trama). O Primeiro trabalho-solo do guitarrista chegou há pouco às lojas e traz parcerias com outros ótimos músicos e amigos, como Buia do Z'África Brasil, Chiquinho Moreira, do Mombojó, e Siba, ex-Mestre Ambrósio. 'Ainda não é nada definitivo. Estamos acertando os ponteiros e acordes. Mas está ficando bacana', dizia o guitarrista da Nação Zumbi.

Mais que um dos músicos da banda mais poderosa (poder aqui se refere ao som poderoso dos meninos de Pernambuco) do rock nacional, Maia é também o melhor guitarrista do Brasil. Pode parecer tietagem, mas quem acompanha a cena rock nacional concorda. A Nação pode não ser melhor que ninguém, mas é única. Quer comprovar? Assista a um show em pleno marco zero do Recife no carnaval. Na terra do frevo e do maracatu, a Nação é responsável por delírios afrociberdélicos de todas as tribos. Ou assista a um show da banda na Praça da Sé durante a Virada Cultural. Tinha gente de todos os cantos e nações. Na última Virada, em abril, até os manos do rap que ali estavam para assistir aos Racionais MCs pararam para ver o bloco do maracatu atômico passar.

Tudo isso para dizer que Maquinado é a prova de que uma banda pode permanecer unida e melhorar cada vez mais, sem deixar de dar a seus integrantes a liberdade de tocar projetos paralelos. Tanto que Jorge Du Peixe, Dengue e Toca Ogam (respectivamente, vocalista, baixista e percussionista da Nação) participam de várias faixas do CD. Du Peixe já havia sido parceiro de Maia em outro projeto, que, não por acaso, deu origem a Maquinado.

Maia conta que desde o início da carreira queria fazer algo parecido. A idéia começou a tomar forma depois que ele e Du Peixe compuseram a trilha sonora de Amarelo Manga (de Cláudio Assis. Depois processo de compor e guardar muitas das criações numa pasta do computador, Maia tinha mais de 30 faixas-base. Foi quando deu início ao culto da 'mecanização do pensamento'.

Maia e parceiros de Maquinado professam suas preces em códigos binários, em um culto à tecnologia. Este culto não deixa de ter sua parcela crítica e brincalhona, que se evidencia nas viagens sonoras dignas de odisséias no espaço. Como bem diz, 'o maior amigo do homem só entende certo e errado, verdadeiro e falso, ligado e desligado'. O computador, e não o cão, é hoje alvo de devoção. Como já disse a Nação Zumbi, computadores fazem arte e artistas fazem dinheiro. Maquinado faz pensar e faz viajar. Impossível não ter vontade de sair dançando ao som de Tá Tranqüilo, um pós-ragga em parceria com Speedy Freaks. Arrudeia, a primeira faixa do CD, é uma viagem futurística que prova por que Maia consegue ao mesmo tempo se aventurar por riffs psicodélicos e pelo suingue tão brasileiro. Destaque para os teclados de Chiquinho.

Do futuro para as raízes do samba do pandeiro que Toca Ogam esbanja na faixa seguinte, a deliciosa Não Queira se Aproximar. Toda a malandragem na voz de Funk Buia, do Z'África Brasil. Alados vai mais fundo ainda nas raízes e convida para uma ciranda ao som do menestrel Siba, acompanhado por Dengue, Carranca (na caixa) e Roberto Manoel (trompete). A viagem continua pelas ambientações, groves perfeitos, ora minimalistas ora melodias que grudam feito chiclete, de Maia. Maquinado e o 'homem binário'? Tem que ouvir pra saber.

(© Agência Estado)


Maquinações no mangue


Guitar hero da Nação Zumbi, Lúcio Maia lança disco solo e reinventa as sonoridades de sua banda titular

Quando ainda era capitaneada por Chico Science, a Nação Zumbi se firmou no universo roqueiro (entre outros universos musicais) ao trazer para a roda o som dos tambores do maracatu pernambucano. Depois que a estrela de Science se apagou, os tambores passaram a bater ainda mais forte, a falar mais pela banda. Em meio a tudo isso, é um tanto difícil imaginar que o som da velha guitarra pudesse fazer alguma coisa numa banda como essa. Mas ela não só fez, como continua a fazer.

Lúcio Maia, o responsável pela seis cordas na banda pernambucana, é um dos mais criativos guitarrista a aparecer no país nos últimos 20 anos. Seu estilo é visceral e performático, como os grandes do instrumento na história do rock. Entretanto, ele está longe de fazer o tipo egoísta, que a maioria dos guitarristas faz. Maia é consciente de seu papel na Nação e não enfia solos onde as canções pedem acordes básicos.

Portanto, nada mais justo que dar a merecida atenção a seu primeiro álbum solo. Ou quase isso. Lançado pela Trama (ex-gravadora da Nação), “Homem Binário” é a estréia em disco do projeto Maquinado, espécie de “Lúcio Maia convida” das geração manguebeat e pós-manguebeat.

Para aqueles que o consideram um legítimo deus da guitarra brasileiro (como este jornalista que aqui escreve), o disco vai soar como uma grande surpresa. O solo não é um disco cheio de guitarras, nem tem uma pegada mais rock’n’roll. O peso da nação é abandonado em prol de uma sonoridade climática, quase lounge. O flerte com a eletrônica, presente nos trabalhos com sua banda titular, dominam o disco.

Se surpresa pode ser confundida com decepção, em um primeiro momento, a confusão não resiste às audições seguintes. “Homem Binário” é, mais que um bom disco, um disco importante. Como Maquinado, Maia é um enciclopedista de novos sons, que podem e devem ser “roubados” e transformados por quem tiver competência.

Trilha sonora

O projeto Maquinado surgiu quando Lúcio Maia e seu companheiro de banda Jorge Du Peixe gravaram algumas músicas para a trilha sonora do filme “Amarelo Manga” (2003), de Cláudio Assis. Os novos processos de gravação e as possibilidades descobertas fizeram a cabeça do guitarrista. Tanto que “Homem Binário” soa com a música de fundo para um filme imaginário.

Como este não existe, a trilha de Maia ganha o primeiro plano. “Arrudeia” abre o disco, lembrando os alemães do Kraftwerk, mas os elementos brasileiros deixam claro sua procedência. “Não queira se aproximar”, cantada por um certo Buia, mais parece uma canção do Planet Hemp, com levada hip hop e guitarra distorcida de Maia.

“Tá tranqüilo” entra com um batidão pesado - misto de Nação com Nine Inch Nails. “Aladas”, canto choroso, pernambucano, com tambores artificiais e trombones à cubana. “Sem concerto” é uma canção pop, futurista, mas como cheiro da década de 1980. “O dia do julgamento” é inexpressiva, mas precede a boa “O som”, parceria com Jorge Du Peixe, nem precisa dizer o que lembra. “Eletrocutado” é outra que mistura o manguebeat e hip-hop. “Despeça dos argumentos” lembra Jorge Ben, mas com uma lentidão chapada.

Em “Vendi a Alma”, Maia volta a se aproximar do rock industrial, mas mesclado ao samba (!). O disco fecha com “Além do Bem”, em clima de hip hop, trip hop e jazz.

DELLANO RIOS
Repórter

ELETRÔNICO: Trama 2007 - 11 faixas - R$ 25 - "Homem binário", de Maquinado

(© Diário do Nordeste)

 

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