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Uma produção politicamente correta

11/06/2008

Ariano Suassuna, autor de A Pedra do Reino


Segunda reportagem sobre A Pedra do Reino mostra como a população de Taperoá (PB) e de outras cidades participa da megaprodução

OLÍVIA MINDÊLO
Enviada especial

TAPEROÁ (PB) – “É uma emoção que não tem palavras. A cidade está renascendo, gente”. Num discurso emocionado à reportagem do Jornal do Commercio, a taperoaense Beatriz Lelis, 27, resumiu o que está acontecendo com sua cidade: Taperoá, no Cariri paraibano, tem visto sua auto-estima crescer depois que a equipe da microssérie (formato com quatro a oito capítulos) A Pedra do Reino, baseada no Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, de Ariano Suassuna, se alojou no município, há cerca de um mês. A política de inserção social do projeto Quadrante, que está aproveitando o talento da população local para trabalhar nos diferentes núcleos e ateliês da série, é um dos grandes diferenciais da iniciativa dirigida por Luiz Fernando Carvalho e é o destaque do segundo dia da série de reportagens do JC, iniciada ontem. Até amanhã, iremos destacar o que nos chamou atenção na visita aos bastidores da produção da adaptação de Carvalho para a televisão, com previsão de estrear na Rede Globo em junho de 2007.

Beatriz Lelis, que nem sabia que tinha atriz no nome (e na vida), foi uma das pinçadas do universo sertanejo para integrar a história narrada segundo as memórias de Dom Pedro Diniz Ferreira Quaderna, personagem principal do livro. Enfermeira de um posto de saúde de Taperoá, ela fará o papel de uma mãe que tem a graça concedida ao filho doente depois de oferecê-lo à imagem de Sebastião, figura mítica que permeia o enredo de Suassuna e é uma referência constante no imaginário do Sertão nordestino – vem de Dom Sebastiãio, rei de Portugal pelo qual todos esperaram a volta após sua morte, originando o culto ao sebastianismo. “É uma cena muito forte”, comentou Beatriz, que cresceu fazendo danças populares. “O teatro é mágico. Antes dessa experiência, eu não me conhecia. Isso mudou todo o meu olhar”, atesta.

Já a bordadeira Maria Aparecida Diniz, 50, está trabalhando no núcleo da figurinista Luciana Buarque, pernambucana radicada no Rio de Janeiro. Como Beatriz, Aparecida também passou a vida em Taperoá e jamais tinha feito trabalho semelhante. “Eu bordo há 30 anos, mas sempre fiz enxoval de casamento e bebê. Estou achando diferente”, contou Aparecida enquanto bordava uma peça para A Pedra do Reino. A costureira Maria José Ramos, 38, também foi uma das que ganhou trabalho com a chegada da Academia de Filmes, produtora independente que está à frente da microssérie. Ela costura há 15 anos e ficou feliz de ser escolhida: “Chama muito atenção esse trabalho, é muito atrativo. Estar nesse meio é muito bom, estou aprendendo”.

Em cada núcleo da megaprodução, orçada em mais de R$ 2 milhões (cerca de 400 mil reais cada capítulo), há alguém de Taperoá, de um município vizinho, de estados nordestinos. O de figurino, por exemplo, conta com 12 pessoas da população local, enquanto o de arte lança mão de 20, entre artesãos, artistas plásticos, etc.. Na cidade cenográfica que está em construção num espaço de cerca de 2.500 m², todos os pedreiros e marceneiros, por exemplo, são do Cariri paraibano. “Aqui não tem cinema, não tem teatro, a cultura é desvalorizada. O jovem só tem duas alternativas: ou sair para beber ou ir para boate. E se a gente tirar isso, vai dar o que como alternativa?”, ressalta a importância do projeto Beatriz Lelis. Para o ator Flávio Rocha, de Tuparetama (PE), essa estratégia do projeto é a única maneira de fugir do clichê nordestino na TV. É. Esperamos por isso.

(© JC Online)


Diretor de arte transforma sobras em magia

A linha politicamente correta está tão arraigada à produção de Luiz Fernando Carvalho que a criação consciente vai além da inserção dos habitantes da região na equipe da microssérie A Pedra do Reino. Exemplo forte dessa linha de trabalho é o núcleo de arte, capitaneado pelo artista plástico cearense Raimundo Rodriguez.

Grande parte das peças que o diretor de arte vai utilizar para compor as cenas da da microssérie que vai contar a história mítica de Quaderna, ao relembrar a sua vida sertaneja após ser preso pelo Estado Novo, está sendo confeccionada a partir de sobras, restos de materiais ou objetos reaproveitados.

“A intenção não é ecológica, pode até ser que a conseqüência seja essa. A questão é o conceito mesmo do meu trabalho, de buscar a alma perdida das coisas, de reciclar os sentimentos”, explicou Rodriguez ao JC.

Armaduras e coroas dos cavaleiros da cena da Cavalgada, por exemplo, são feitas de latas reaproveitadas. “A lata é o carro-chefe. Lata é ótimo, vira ouro”, disse. Sobras de palhas de milho, caixas de papelão e embalagens de alimentos se transformam em peças únicas de esculturas de cavalos. Uma das vestimentas de guerra, inspirada nos samurais, foi elaborada, por exemplo, com palitinhos de sorvete. “Todos os materiais e objetos já foram utilizados. O que nos interessa é o significado, o símbolo das coisas, e cada objeto traz a essência do universo e tem que contar a história”.

Carcaças de animais achadas na estrada, assim como couros de bicho morto também foram parar na casa do núcleo de arte – por sinal, a mesma onde Ariano Suassuna viveu até 15 anos. O interessante é que os ossos e as carcaças de bodes, bois e de outros animais estão ganhando vida nas mãos do mamulengueiro pernambucano José Lopes. Ele foi contratado pelo núcleo de Rodriguez para contribuir com a magia da microssérie. O material tem feito surgir criaturas parecidas com pássaros pré-históricos, dragões e seres de outro mundo, que se mexem e serão utilizados pelos atores, “como uma extensão de seus corpos”.

Na verdade, não só o núcleo de arte, mas o de cenário, caracterização e figurino estão orientados a trabalhar com materiais reaproveitados ou envelhecidos, para que eles dêem o tom da irrealidade e da imaginação que perpassa o romance. A memória é a tônica, não é à toa que a cidade cenográfica vai ser toda branca, como um “grande fóssil”. (O.M.)

(© JC Online)


Diretor aposta em novos talentos da região

O ator pernambucano Irandhir Santos, 28 anos, foi um dos escolhidos pelo diretor Luiz Fernando Carvalho para integrar o elenco de cerca 60 atores que irão atuar na microssérie A Pedra do Reino. Há cinco anos habituado aos palcos de teatro, ele terá nada menos que encarnar o protagonista da história, Dom Pedro Diniz Ferreira Quaderna, ou Quaderna.

“Estou encarando a tarefa com tranqüilidade e serenidade. É muito prazeroso, é um grande presente dado surpresamente por Luiz (Fernando Carvalho)”, comentou o ator que conheceu o diretor há três anos. Irandhir já rodou 14 estados brasileiros pelo projeto Palco giratório, do Sesc, com a peça Quem tem tem medo. Além disso, fez uma participação no filme Cinema, aspirinas e urubus, em Baixio das bestas, que deve estrear este ano, além de curtas-metragens pernambucanos. Esse é o primeiro trabalho para TV, em seus quase sete anos de carreira.

Nascido em Barreiros e criado em Limoeiro, ele diz que sempre foi um leitor da obra literária e dramaturgia de Ariano, mas nunca havia passado pelas páginas de A Pedra do Reino. “Agora acho a grande obra de Ariano”, disse. Ele explicou que Carvalho faz, no texto, brincadeiras com tempo e espaço para cumprir uma tradução visual da narrativa em primeira pessoa.

Assim como os demais, Irandhir está passando por um laboratório de preparação de atores, com ensaios e exercícios com corpo, máscara e outras estratégias para afinar o elenco, que também está recebendo aulas de dança.

Outros pernambucanos também estão no elenco, como é o caso de Prazeres Barbosa, Roger de Renor, Renata Rosa, Mestre Salustiano, Walmir Chagas, Hermylla Guedes, Abdias Campos e Flávio Rocha, ator desconhecido de Tuparetama, no Sertão pernambucano. Há também gente da Paraíba, do Ceará, da Bahia e do Rio Grande do Norte. Alguns são já conhecidos, como os paraibanos Luiz Carlos Vasconcelos (Baile perfumado, Eu, tu, eles) e Servílio de Holanda, ator excepcional da peça Vau da Sarapalha, há quase 15 anos em cartaz.

Taperoaenses também foram pinçados por Manoel Constantino, responsável pela produção do elenco (casting). O figurantes, ainda em processo de escolha, serão todos da cidade. Ao todo, são cerca de 70 personagens atuando na microssérie. É aguardar para ver.

(© JC Online)


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