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Baião de dois

22/11/2006

Paternidade: Gonzaguinha (de bolsa) morreu sem saber se Gonzagão era mesmo o seu pai

Gonzaguinha e Gonzagão conta a vida de dois gigantes da música brasileira

Por Luiz Chagas

A vida dos dois, pai e filho, foi andar por esse país: tocando, cantando e festejando o orgulho de serem brasileiros. Eles têm histórias parecidas que diferem num único ponto: o pai amadureceu correndo atrás do sucesso, o filho passou dois terços de sua vida correndo atrás do pai – queria que ele o reconhecesse e o acolhesse. A trajetória dessa dupla é contada em detalhes no livro Gonzaguinha e Gonzagão – uma história brasileira (Ediouro, 384 págs., R$ 90), de autoria da jornalista Regina Echeverria (escreveu biografias de sucesso como a de Elis Regina e a de Cazuza). Luiz Gonzaga, o pai, influenciou definitivamente a música brasileira e já reinava nas rádios nos anos 40 e 50 quando lançou Asa branca, uma das composições mais conhecidas no Brasil, perdendo apenas para Carinhoso, de Pixinguinha. Não bastasse isso, foi exaltado e recuperado mais tarde pelo tropicalismo comandado sobretudo por Gilberto Gil e Caetano Veloso. O outro Luiz Gonzaga, o filho, tornou-se um símbolo de resistência contra a censura e o autoritarismo militar nos anos 70 e ficou nacionalmente famoso a partir de alguns sambas, boleros e, principalmente, com a música Explode coração. Resumo do baião: ambos foram dois dos maiores artistas desse país.

Divulgação
No show Vida de viajante, em 1979, Gonzagão disse ao filho: “Você é Luiz Gonzaga do Nascimento Jr. Eu fui ao cartório e registrei”

Paternidade é uma das questões fundamentais na vida desses dois cantores e compositores. Gonzaguinha, nascido em 1945, é filho da cantora e compositora Odaléia Guedes dos Santos, que foi muito amiga de Elizeth Cardoso e de outras estrelas do passado. Gonzagão, exímio sanfoneiro e responsável pela divulgação do baião pelo País inteiro, abandonou a mulher (morreu de tuberculose quando o filho tinha dois anos) porque ela preferia ser artista a dona-de-casa. Gonzagão também não ficou com o filho, que então foi criado no bairro carioca do Estácio por um casal amigo do pai: o violeiro baiano Xavier e sua mulher, Dina (citada por Gonzaguinha, carinhosamente e muito mais tarde, em uma de suas músicas: “Diz lá pra Dina que eu volto/que seu guri não fugiu/só quis saber como é, qual é?/pernas no mundo partiu.”) Quando procurou o pai, já casado com Helena (com quem havia adotado uma menina, Rosinha), o garoto foi rejeitado. Para piorar a situação, Gonzagão, que fugira de casa aos 18 anos, se dizia estéril devido às doenças venéreas contraídas nos dez anos em que andou pelo Brasil engajado no Exército.

Divulgação
Gonzaguinha compôs Grito de alerta inspirado num caso amoroso de Agnaldo Timóteo com outro homem

Pai e filho, e aqui já cabe a ressalva da dúvida porque talvez eles não fossem pai e filho, registraram esses acontecimentos em 1979 durante a turnê do show Vida de viajante, quando os dois se apresentaram juntos pela primeira vez. Gonzagão foi taxativo: “Não posso enfeitar muito isso porque estaria enganando a você e a mim mesmo. A verdade é que você é Luiz Gonzaga do Nascimento Jr. Eu fui ao cartório e registrei. Tem pouca coisa para contar porque não vivi com sua mãe nem dois anos.” Para diversas pessoas entrevistadas por Regina Echeverria, que teve acesso às inúmeras fitas gravadas por Gonzaguinha com suas reflexões, isso é definitivo: nenhum nordestino, e no caso um pernambucano de Exu machista até a medula, como era Gonzagão, daria seu sobrenome a um filho que não fosse seu. Mas, como os herdeiros descartaram a hipótese de se fazer um exame de DNA (o pai morreu em 1989, devido a complicações decorrentes de osteoporose, e o filho faleceu num acidente de carro no Paraná, dois anos depois) a dúvida ainda permanece: Gonzaguinha era ou não era filho de Gonzagão?

O livro é repleto de curiosidades. Uma delas é a origem do nome do sanfoneiro. Filho de Januário dos Santos e Ana de Jesus Alencar, Luiz Gonzaga, nascido em 1912, foi levado para ser batizado pela avó que ao pisar a igreja ainda não decidira qual o nome que daria ao neto. O padre se lembrou, então, que naquele dia se homenageava santa Luzia. Como a criança era um menino, Luzia virou Luiz na pia batismal. O Gonzaga veio do nome do protetor do padre e Nascimento em razão de o menino ter nascido em dezembro, como Jesus. Também no livro de Regina Echeverria fica-se sabendo que Gonzagão se tornaria o Rei do Baião, paramentado como um cangaceiro e cantando canções de sua terra, porque foi muito incentivado por um estudante de direito cearense que tempos depois chegaria ao posto de ministro da Justiça do ex-presidente João Figueiredo. Seu nome: Armando Falcão. Até dar início a sua fase de sanfoneiro, Luiz Gonzaga se vestia de terno (“como um lorde”, dizia ele) e cantava valsas e tangos. Assim, pelo menos no campo musical, Gonzaguinha e seus bolerões podem ser considerados herdeiros legítimos da fase inicial da carreira de Gonzagão. Ao contrário do que se imagina, no entanto, as letras passionais de suas músicas passam longe de sua experiência pessoal. A genial composição Grito de alerta, por exemplo, surgiu de um caso amoroso que o cantor Agnaldo Timóteo teve com um homem. Ele contou o seu drama a Gonzaguinha. O tempo passou e, um belo dia, ouviu a música nas rádios. Timóteo procurou o amigo e, bem-humorado, lhe disse: “Puxa vida, Gonzaguinha, eu te conto uma história da minha cama e você dá a música para a Bethânia gravar?

(© Isto É)


Show "A história dos 60 anos do Baião" no Sesc Pinheiros

Nos próximos dias 25 (sábado , às 21h) e 26 (domingo, às 18h) de novembro, o SESC Pinheiros (Rua Paes Leme, 195 – Pinheiros) será palco de mais um tributo à música brasileira – A história dos 60 anos do Baião. A história desse gênero musical, criado por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira em 1946, começa com o lançamento, no mesmo ano, do ritmo no Rio de Janeiro pelo grupo musical cearense 4 Ases e 1 Coringa.

O espetáculo que é roteirizado, dirigido e apresentado pelo jornalista e pesquisador da cultura popular Assis Ângelo, biógrafo do rei do baião, coloca no palco, músicos e cantores consagrados como Dominguinhos, Carmélia Alves, Anastácia e os cantadores repentistas Oliveira de Panelas e Bule-Bule, além de Socorro Lira, Cezar do Acordeon, a dupla de emboladores Caju e Castanha e o violonista e compositor Gereba, que também é responsável pela direção musical e arranjos. A Camerata Sopros e Cordas (sanfona, triângulo e zabumba, viola, violões, clarineta, rabeca, baixo acústico, cello e violinos), faz o acompanhamento do espetáculo sob regência do maestro Marcelo Martins.

História

Luiz Gonzaga era pernambucano de Exu e Humberto Teixeira de Iguatu, Ceará. Os dois se conheceram no Rio e compuseram a primeira música, o xote no Meu pé de Serra, em 1946, lançado no ano seguinte. Após mostrar como o baião é dançado, Gonzaga o explicava, cantando: “Um triângulo, uma sanfona, um zabumba / Uma cabrocha baionando um balanceio.../ Então isso é baião / E baião por si só é tesouro e meio” (Tesouro e Meio). Gilberto Gil, em 1976, compôs De Onde Vem o Baião?. Ele próprio explica: “...Vem de baixo do barro do chão / De onde é que vêm o xote e o xaxado?/ Vêm de baixo do barro do chão / De onde vêm a esperança, a sustança espalhando o verde dos teus olhos pela plantação? Ô-ô / Vêm de baixo do barro do chão...”.

No auge do sucesso, o rei Gonzaga lia satisfeito, na Revista Radar, do Rio , manchetes como: “A ordem agora é baião, coqueluche nacional” e, no Diário Carioca: “O baião vem fazendo estremecer todo o vasto império do samba e já agora não se poderá mais negar a influência decisiva desse gênero musical na predileção do povo”.

Enquanto isso, as gravações estrangeiras da música de Gonzaga e Teixeira rapidamente se multiplicavam, através de Carmen Miranda e Silvana Mangano, Peggy Lee, Demis Roussos, Lydia Scotty, Herbie Mann, Stan Kenton, Perci Faith, Dizzy Gillespie, Luis Garzon, Caterina Valente, Amália Rodrigues, Keiko Ikuta, Kon-Tiki, Georges Henry, Leo Marini, Victor Young, Burt Bacharach e brasileiros, como Augusto Calheiros, Nélson Gonçalves, Chico Alves, Manezinho Araújo, Ivon Curi, Edu da Gaita , Jorge Goulart, Altamiro Carrilho, Marlene, Maysa, Ademilde Fonseca, Isaurinha Garcia, Carmen Costa e Emilinha Borba, além de Vandré, Caetano, Gil, Tom Zé, Zé Ramalho, Alceu Valença, Fagner. Nem o papa da bossa nova, João Gilberto, ficou alheio à onda provocada pelo baião e a seu modo compôs e gravou no seu segundo disco de 78 rpm Bim Bom, que diz: “Bi m bom bim bom bim bom / É só isso o meu baião / E não tem mais nada não / O meu coração pediu assim, só / Bim bom bim bom bim bom...”. Vale a pena conferir e conhecer um pouco da história desse gênero musical.  

Serviço
Show:
A história dos 60 anos do Baião
Participação:
Dominguinhos, Carmélia Alves, Anastácia, Oliveira de Panelas, Bule-Bule, Socorro Lira, Cezar do Acordeon, Caju, Castanha, Gereba, Camerata Sopros e Cordas e do maestro Marcelo Martins.

SESC Pinheiros
Rua Paes Leme , 195 – Pinheiros – São Paulo
Fone: 11 3095-9400
25/11 – Sábado – às 21h
26/11 – Domingo – às 18h

Ingressos: R$ 15,00; R$ 10,00 ( usuário matriculado Sesc) e R$ 7,50 ( trabalhador no comércio e serviços matriculado e dependentes, aposentados e estudantes com carteirinha).

(© Sobre Elas)


Vídeo:

Saiba mais sobre Gonzaguinha e Gonzagão – uma história brasileira


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