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Imagens perpetuam o mito de Lampião

30/11/2006

 

Exposição "Cangaceiros", no MIS-SP, reúne 86 fotografias que atestam a história do rei do cangaço

EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Misto de bandido sanguinário e anti-herói nacional, Virgolino Ferreira da Silva, o Lampião (1898-1938), é personagem dos mais instigantes que a história do Brasil produziu. Em "Cangaceiros", que começa hoje no MIS-SP, a saga do rei do cangaço e seu bando surge em 86 fotografias que atestam a existência de uma história que, sem elas, teria se tornado mera fábula de literatura de cordel.

A mostra será aberta com um debate, às 19h30, com Expedita Ferreira Nunes, filha de Lampião e Maria Bonita. Até domingo, serão exibidos seis filmes sobre o tema. Estarão à mostra ainda objetos como 20 punhais e duas pistolas de Lampião, além de jóias e uma roupa de Maria Bonita. Das 86 imagens, 57 foram produzidas pelo mascate libanês Benjamin Abrahão, mítico personagem que chegou ao Brasil em 1915 e logo se tornou secretário de padre Cícero, em Juazeiro (CE).

Em 1926, um convite tira o bando de Lampião da ilegalidade por um tempo. Com o governo querendo exterminar a Coluna Prestes (movimento político-militar de esquerda liderado por Luís Carlos Prestes), Virgolino é chamado a integrar os Batalhões Patrióticos. De bandido, vira herói nacional.

Nessa época, Lampião vai a Juazeiro. É recebido com honrarias por padre Cícero e conhece Abrahão. A amizade leva Lampião, dez anos depois, a autorizar o mascate a fazer uma reportagem escrita, fotografada e filmada sobre o bando. Esses registros chegam ao MIS ao mesmo tempo em que estão em exibição em Paris.

Nos dois eventos, será lançado o livro "Cangaceiros", da historiadora francesa Élise Jasmin. Quase a totalidade das fotografias mostra os cangaceiros posando para a câmera. Não há imagens de ação. Abrahão vendia com sucesso essas imagens exclusivas a jornais e revistas.

Em 1937, com o Estado Novo, recrudesce o cerco ao bando de Lampião. As fotografias de Abrahão publicadas na imprensa soavam como um desafio. Surgem as volantes, milícias armadas para combater o cangaço. Várias fotos mostram essas milícias posando exatamente igual ao bando de Lampião. Antes do confronto armado, a guerra aconteceu na representação fotográfica.

A mostra termina com imagens de cangaceiros decapitados, exibidos como troféus. Uma delas, de autor desconhecido, mostra Lampião, Maria Bonita e nove cangaceiros com cabeças expostas numa macabra prateleira. Imagem que atesta a morte do homem e perpetua definitivamente o mito.

CANGACEIROS
Quando:
hoje (abertura), às 19h30; de ter. a dom., das 10h às 18h. Até 4/3
Onde: MIS (av. Europa, 158, tel.: 0/xx/11/3062-9197
Quanto: R$ 3

(© Folha de S. Paulo)


O vaidoso cangaceiro que virou história
Márcia Abos, O Globo Online

SÃO PAULO - "O século passado estava, dando sinais de cansaço, José e Maria presos, por matrimonial laço, em breve seriam pais, do grande rei do cangaço. No dia quatro de junho, de noventa e oito, a pino estava o Sol, e Maria dava à luz um menino, que receberia o nome singular de Virgulino."

Estes são versos de cordel do escritor Gonçalo Ferreira da Silva. Falam do nascimento de Lampião, Virgulino Ferreira da Silva, em 1898. Durante muito tempo a história de Lampião se espalhou apenas no boca à boca e nos versos dos livretos de cordéis pelo sertão nordestino. Agora, 68 anos depois de sua morte, o Brasil começa a reviver esta história.

O Museu da Imagem e do Som (MIS) abre nesta quarta, dia 29, a exposição "Cangaceiros". É uma oportunidade para saber mais sobre Lampião e seu bando. O museu reuniu fotografias históricas e filmes sobre o homem que percorreu sete estados brasileiros durante mais de vinte anos, fugindo e lutando contra as volantes da Polícia. E a polícia tinha muito a ver com os cangaceiros na época. As volantes eram grupos de vinte a setenta homens armados e nômades, que reuniam ao mesmo tempo soldados e mercenários.

Um dos organizadores da exposição é Ricardo Albuquerque. Ele é neto de Benjamin Abrahão, o fotógrafo oficial de Lampião. Ajudou a reunir e restaurar o acervo de fotos e o filme de onze minutos que fazem parte desta mostra. ( Veja fotos da exposição e ouça a história de Lampião .)

- O resultado desta exposição vem de um trabalho de quatro anos. Todo o acervo de Benjamin Abrahão pertencia à minha família, em Fortaleza, inclusive o filme. Eu comecei a mapear todo este material e a fazer a restauração. É o único filme que foi feito de Lampião e seu bando. Hoje temos um pedaço de onze minutos deste documentário, que também será exibido no MIS - conta Albuquerque.

A fascinação por um homem corajoso, líder de um bando e acompanhado por uma bela mulher, ultrapassou fronteiras. A exposição do MIS foi vista antes na pequena Montpellier, cidade do sul da França, por 12.500 pessoas. E está em cartaz desde 9 de novembro em Paris, na Maison da América Latina.

Junto com a mostra será lançado o livro "Cangaceiros", da historiadora francesa Élise Jasmin. Na publicação, estão reunidas e explicadas as 86 imagens que compõem a exposição. Élise defendeu uma tese na Sorbonne sobre Lampião.

Em 1926, Lampião foi a Juazeiro do Norte atendendo a um convite de Padre Cícero. O Ceará vivia um momento de violência e agitação por causa da presença da Coluna Prestes no estado - grupo revolucionário que marchava pelo Brasil propondo reformas sociais e políticas. O governo incentivou a formação de 'batalhões patrióticos' para combater a Coluna Prestes.

Por meio de Padre Cícero, de quem Lampião era devoto, o governo convidou o cangaceiro e seu bando a formar um destes batalhões e ajudar no combate à Prestes e seus seguidores. Lampião aceitou a proposta e se beneficiou com ela. Recebeu munição, armas e apossou-se da patente de capitão, mas jamais chegou a combater a Coluna Prestes.

Na mesma época, Lampião conheceu Benjamin Abrahão, que não era fotógrafo, era secretário do Padre Cícero. Benjamin só se juntou ao bando de Lampião como seu fotógrafo oficial após a morte de Padre Cícero, em 1935.

Lampião dava muita importância a sua imagem. Não só teve um fotógrafo oficial como lia tudo o que se publicava sobre ele. Pensou um dia em virar história, e virou.

Ele freqüentemente solicitava a Benjamin exemplares de jornais do Rio de Janeiro e do litoral nordestino que trouxessem notícias a seu respeito. Lia-os em público, fazia comentários e mostrava satisfação ou ódio, de acordo com a situação.

O bando de Lampião foi o primeiro e o único a aceitar mulheres. Maria Bonita abandonou o marido e filhos para viver com Lampião. Antes de tornar-se mulher do rei do cangaço, ela se chamava Maria de Déa. Sua beleza era considerada excepcional. Mas Maria Bonita também ficou famosa pela dureza de seu coração e por sua coragem. Os filhos eram dados para serem criados por amigos ou familiares.

Outra estrela feminina do cangaço foi Dadá, que casou de papel passado com Corisco, Cristiano Gomes da Silva Cleto, coisa rara entre os cangaceiros. E levou o homem conhecido como Diabo Loiro para casar na igreja. Foi Dadá quem criou os bordados vistos nas roupas e nos chapéus dos cangaceiros do bando de Corisco e Lampião.

Corisco foi chefe de um sub-bando ligado ao de Lampião. Entrou para o Exército em 1924 e desertou. Encontrou refúgio no cangaço. Foi fiel até o fim a Lampião. Morreu dois anos depois de seu líder, em 25 de maio de 1940, assassinado pelo tenente José Rufino. Chegou a vingar a morte de seu chefe com extrema violência, mas não conseguiu assumir o lugar de Lampião, como desejava, por causa de sua falta de diplomacia com os coronéis. A morte de Corisco anunciou a extinção definitiva do cangaço.

Exposição "Cangaceiros" - Museu da Imagem e do Som (MIS) - Avenida Europa, nº 158 - Telefone: 11 3062.9197 ou 11 3088.0896 - De 29 de novembro a 4 de março de 2007 - Ingresso: R$ 3,00 e R$ 1,50 (meia-entrada) - De terça a domingo, das 10h às 18h

(© O Globo)


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