11/06/2008
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O compositor
Humberto Teixeira |
Chega a vez de o parceiro mais famoso de
Luiz Gonzaga, o cearense Humberto Teixeira, ter também sua biografia
e songbook lançados
JOSÉ TELES
Depois do livro de Regina Echeverria sobre
Gonzagão e Gonzaguinha, um dicionário de Gonzagão compilado pelo
radialista paraibano Assis Ângelo, chega a vez do parceiro Humberto
Teixeira ter também sua biografia e songbook lançados. O
cancioneiro Humberto Teixeira, dois luxuosos volumes, bilíngües,
fartamente ilustrados, foi publicado pela Jobim Music/Good Ju–Ju,
parceria entre Ana Lontra Jobim e Denise Dumont, respectivamente,
viúva de Tom Jobim e filha de Humberto Teixeira, com a chancela do
Centro Cultural Banco do Nordeste (o preço dos dois: R$ 176,00). A
biografia, sucinta, mas coalhada de informações, é de Ricardo Cravo
Albin. A supervisão musical do songbook (obras escolhidas) é de
Paulo Jobim com arranjos de Wagner Tiso, programação visual do
especialista Gringo Cárdia, introdução de Sérgio Cabral e prefácio
de Tárik de Souza.
A dobradinha de Humberto Teixeira com Luiz Gonzaga
durou menos de cinco anos, mas foi fundamental para a música
brasileira. Lendo-se o perfil que Ricardo Cravo Albin faz de
Teixeira não é de se estranhar que a parceria tenha acabado, e sim
que tenha demorado tanto a terminar. Em 1945, quando Luiz Gonzaga
foi levado pelo compositor Lauro Maia ao escritório do advogado
Humberto Teixeira, na Avenida Calógeras, no Centro do Rio, dois
mundos diferentes se encontraram. Gonzaga, negro, semi-analfabeto,
filho de agricultores, morava no morro de São Carlos, começava a
engatinhar uma carreira no rádio, depois de tocar alguns anos no
mangue (o baixo meretrício carioca). Humberto Teixeira tinha origem
em uma família classe média abastada do interior cearense. Viera
para o Rio de Janeiro estudar medicina, acabou formando-se em
advocacia. Conciliou a vida de estudante com a de compositor.
Relacionou-se logo com o que havia de mais chique na então capital
federal. O que unia Gonzaga e Teixeira era o fato de serem ambos
nordestinos, do Sertão, onde, independente do nível socioeconômico,
foram expostos aos mesmos acordes espartanos, dos mesmos gêneros
musicais.
O baião era um destes: “Na minha infância”, -
afirma Humberto, “ouvia baião a toda hora. E acredito que naquele
mesmo momento, naquela mesma época, do outro lado do Ceará,
fronteiriço, em Exu, Pernambuco, onde nasceu Luiz Gonzaga (ele é
mais velho do que eu, pouca coisa, nós somos quase da mesma idade),
ele estava ouvindo a mesma coisa”, confirma Humberto Teixeira, em
depoimento ao Museu da Imagem e do Som carioca. Quando se
conheceram, Humberto Teixeira já era relativamente bem-sucedido como
compositor, enquanto Luiz Gonzaga começava a ser reconhecido como
sanfoneiro. Calcado no sanfoneiro Pedro Raimundo, que cantava as
tradições gaúchas, trajado a caráter, pretendia deflagrar uma onda
de música nordestina no “Sul”. Receptivo, Humberto Teixeira repassou
com ele os ritmos do “Norte”, que os dois conheciam tão bem.
Decidiram acertadamente pelo baião, segundo Teixeira, muito mais
fácil de se memorizar melodia e coreografia do que o samba. Note-se:
eles criaram uma moda, música e dança acopladas. A letra didática é
praticamente inteira de Humberto Teixeira que, revelou, no citado
depoimento ao MIS, que Luiz Gonzaga preferiu não gravar Baião:
“Só que aconteceu um negócio engraçado, tive a impressão de Luiz,
com toda a segurança da idéia que me propôs, estava temeroso de
botar aquilo na feira, em virtude talvez do sucesso que já estava
fazendo com suas outras músicas. Então entregamos aos 4 Ases e 1
Coringa”.
O baião tornou-se uma criatura maior do que seus
criadores. Dominou o Brasil durante quase dez anos. Foi gravado por
todos os grandes nomes do rádio carioca (e das emissoras regionais
também, e isto não é dito na biografia. Principalmente no Recife,
onde surgiu uma gravadora importante, a Rozenblit). No auge do
sucesso do baião, em 1950, a dupla Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira
foi desfeita. Até hoje é dada como a causa da separação, o fato de
Luiz Gonzaga ter se filiado à sociedade arrecadadora Sbacem,
enquanto o parceiro continuou na UBC. Teixeira seria um dos mais
importantes defensores da classe artística na questão dos direitos
autorais, até se elegeu deputado federal, pelo Ceará, em 1954, tendo
a defesa dos direitos autorais como uma de suas plataformas.
(©
JC Online)
Biografia coloca Gonzagão em segundo plano
A biografia é enviesada na direção de Humberto
Teixeira, em certos trechos, Luiz Gonzaga parece ser apenas um
mero intérprete. O próprio Gonzagão nunca negou que mais
“sanfonava” do que compunha. Mangaratiba, por exemplo,
foi uma das muitas composições que recebeu pronta de Humberto
Teixeira.
O que possuía era o inegável dom de catalisar em torno de si
pessoas que conheciam a alma brasileira, e nordestina, que
ninguém mais do que ele sabia traduzir.
Quando ainda compunha com Humberto Teixeira encontraria outro
compositor de igual, senão maior, talento, o pernambucano Zé
Dantas e ao, longo da carreira, descobriu dezenas de outros
autores. Na biografia também não fica bem explicitado o fim da
parceria Teixeira/Gonzaga: “Quando o baião entrou em declínio,
aí é que está, comecei a fazer música de outro gênero. O Luiz
Gonzaga, anos antes, tinha saído da UBC, sociedade a que ambos
pertencíamos, para ir para outra sociedade, e desfez a parceria”
(do depoimento de Humberto Teixeira ao MIS).
Porém, o primeiro grande sucesso do cearense, depois da
separação artística com Luiz Gonzaga foi exatamente um baião,
Kalu. O maior sucesso do gênero no exterior. Foi também um
dos seus últimos grandes sucesssos. Daí em diante, Humberto
Teixeira continuou a vida que havia interrompido quando conheceu
Luiz Gonzaga, cheia de glamour, mulheres bonitas, e viagens à
Europa. Bem-relacionado, ele estava constantemente na imprensa.
Quando estourou o escândalo do plágio de Juazeiro, por
dois compositores americanos, Harold Stevens e Irving Taylor,
que a rebatizaram de Wandering swalow e deram para Peggy
Lee gravar, as notícias citavam quase sempre Humberto Teixeira
como autor da música.
(©
JC Online)
O bon vivant Humberto Teixeira
Sua lápide fazia menção às suas qualidades
como amigo e compositor. Embora fosse um grande boêmio, era
também um conservador
Um dos projetos mais badalados de Humberto Teixeira (então
presidente da UBC, a União Brasileira de Compositores) foi a
Caravana oficial da música popular brasileira, que levou, em
oito ocasiões, um grupo de artistas para países europeus. A
primeira aconteceu em 1956, a última em 1968.
A proviciana imprensa da época dispensava páginas e mais
páginas para esta “invasão da arte nacional no Velho Mundo”. As
caravanas, que levavam vários dos grandes nomes do rádio, não
tinham esta penetração toda entre os europeus, mas colaboravam
para elevar a auto-estima do brasileiro. Ao mesmo tempo,
Humberto Teixeira era presença constante nas colunas de fofocas.
Foi o fundador do lendário Clube da Chave, uma confraria formada
por 50 pessoas famosas, todos homens. Cada sócio tinha a chave
do clube, localizado no Posto 6 em Copacabana, onde poderia
chegar a qualquer hora, com quem quisesse, e encontraria lá boa
conversa e seu uísque preferido. Faziam parte deste seleto
clube, entre outros, Oscar Bloch, Cill Farney, Dorival Caymmi,
Orlando Silva, Carlos de Laet, Bené Nunes, Marcelo
Chateaubriand, Carlos Guinle. As mulheres que freqüentavam o
clube eram igualmente celebridades como Maysa, Dolores Duran,
Elizeth Cardoso.
O bon vivant Teixeira casaria aos 39 anos com uma das mais
belas mulheres do Rio, a paulista Magarida Pollice, de 23 anos.
Margarida era atriz (trabalhou no cinema e teatro) e pianista de
talento, especializada nos clásssicos e em compositores
sofisticados com os Gerswhin. Ela tocou em algumas das mais
luxuosas casas noturnas do Rio, como a Montecarlo. O conservador
marido, no entanto, não era de ter mulher trabalhando. Margarida
Pollice encerrou, precocemente, a promissora carreira. Porém,
separou-se de Humberto Teixeira sete anos anos depois do
casamento. Foi morar nos Estados Unidos com o então famoso
jornalista e radialista Luiz Jatobá. A futura atriz Denise
Dumont, filha única do casal, ficou morando com o pai (hoje
também vive nos Estados Unidos). O “Dumont” foi adotado porque o
pai, boêmio conservador, não admitia a filha atriz, e muito
menos usando seu sobrenome.
Nos anos 60, o nome de Humberto Teixeira sumiu da imprensa. O
que ganhava como advogado e com direitos autorais lhe garantia
uma vida folgada. Sua atenção concentrou-se em construir uma
mansão, de três pavimentos, em São Conrado, à qual deu o nome de
Mandalai (a casa do filme Rebeca, a mulher inesquecível,
de Alfred Hitchcock). Uma casa imensa para um homem só. A filha
foi para Nova Iorque, aos 17 anos, estudar arte drmática e
voltou casada com o ator Cláudio Marzo, nunca morou na mansão.
Mandalai tinha 13 banheiros, uma enorme piscina, um minijardim
zoológico, cachoeira artificial. Foi no quarto que seria de
Denise, onde Humberto Teixeira faleceu, de um infarto, em 3 de
outubro de 1979. Na sua lápide, no cemitério São João Batista,
no Rio, está escrito: “Humberto Teixeira, Doutor do Baião.
Enquanto existir a palavra amigo, teu nome será lembrado.
Cancioneiro Humberto Teixeira.
Edição de luxo, 188 páginas, a biografia, 176 páginas, o livro
com partituras Preço médio: R$ 176.
(©
JC Online)
Viva Gonzagão festeja 94 anos de nascimento do
Rei do Baião em Exu
O dia de hoje é dedicado ao forró, data do
aniversário do parceiro de Humberto Teixeira, Luiz Gonzaga, que
completaria 94 anos. A efeméride será lembrada com uma série de
eventos no Pátio de São Pedro, no Recife (ver matéria na
página 2) e também em Exu, terra natal do Rei do Baião, onde
ocorre mais uma festa Viva Gonzagão, que começa hoje vai
até domingo, com uma agenda que inclui uma “pré-estréia” de
Gonzagão e Gonzaguinha, com trechos do longa-metragem do
cineasta Breno Silveira (ainda não concluído).
Além do tradicional forró embaixo do pé do juazeiro, no
Parque Aza Branca (que funciona na casa onde morou e está os
restos mortais de Gonzagão, a esposa e seus pais Januário e
Santana). Vão estar por lá muitos seguidores do Rei, entre eles
Joquinha Gonzaga, Flávio Leandro, Nando Cordel, Jorge de
Altinho. A entrada nos dois eventos é gratuita.
O Parque Aza Branca é mantido pela ONG que leva seu nome,
fundada em 23 de agosto de 2001 com o objetivo de empreender
ações voltadas à preservação da obra e da imagem de Luiz Gonzaga
e à conservação do seu museu em Exu. Anualmente, são realizadas
no local A festa da saudade, no dia 2 de agosto
(aniversário de sua morte), e o Viva Gonzagão
(©
JC Online, 12.12.2006)
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Com relação a este tema, saiba mais
(arquivo NordesteWeb)
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