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 Fome insaciável de tudo

 

 

 

A banda pernambucana Nação Zumbi
 

Nação Zumbi, em seu sétimo disco, usa a fome como metáfora para sua música cada vez mais original e variada

José Teles

teles@jc.com.br

O vazamento, na internet, de Fome de tudo, novo CD da Nação Zumbi, que será lançado oficialmente hoje em São Paulo, não agradou nem um pouco à gravadora, muito menos aos integrantes do grupo. “Na realidade nem foi mesmo um vazamento. O cara que disponibilizou deve ter comprado da Deck Disc, que começou a vender o álbum no site antes de mandar para as lojas. Agora, a gente achou uma merda, porque se perdeu o impacto que poderia ter causado. Pessoalmente, esta ânsia de colocar um CD num blog é coisa para babaca, infantil, porque a Deck gastou uma grana em marketing e a antecipação botou tudo a perder.” A reclamação é de Lúcio Maia, guitarrista da Nação Zumbi.

Ele e os outros músicos da banda, mesmo assim, torcem para que os fãs comprem o disco, embora tendo feito o download: “Se não compram, a gravadora quebra, e talvez não tenham outro disco da banda. Além do mais, quem tem o disco em MP3 não está ouvindo Mário Caldato e Nação Zumbi porque a compressão do fonograma faz com que se percam graves e agudos. Sem esquecer o trabalho gráfico de Jorge e Valentina, que é um complemento do disco. Tudo bem, o cara pode alegar que o Radiohead está vendendo o CD novo pelo preço que o consumidor oferecer. Mas há aí uma grande diferença. O Radiohead vendeu 16 milhões de cópias do outro disco. É outra realidade”, continua chiando Lúcio Maia, em entrevista por telefone, de São Paulo, onde mora a maioria dos integrantes do NZ.

Para ele, o produtor (brasileiro, que mora nos Estados Unidos) Mário Caldato é o maior responsável pela sonoridade de Fome de tudo. Caldato era o sonho de consumo da Nação Zumbi desde a época com Chico Science: “Eu e Chico conhecemos Mário em São Paulo, quando a gente gravava Afrocibderlia. Ficamos amigos, ele ainda produziu uma faixa do disco O encontro de Isaac Asimov com Santos Dumont. Quando fomos contratados pela Deck, uma das condições foi gravar com Mário, era o que todos nós queríamos”, conta Lúcio.

Um exemplo da direção de Caldato a mudança no seu próprio trabalho com guitarras no disco: “Eu tinha mania de overdubs (gravar sons sobre outros sons). A gente estava no estúdio, eu ia dobrando um solo de guitarra, quando Mário pediu para que não fizesse. Dobrar para quê? Perguntou a mim, o som não é dobrado. Então gravei sem dubs, e saquei que fica muito melhor, porque no palco a Nação vai soar bem mais parecida com o que se ouve no disco”.

Se Mário Caldato traçou as coordenadas sonoras, a fome é o leitmotiv do disco. O termo está disseminado pelas letras das canções, empregada no sentido estrito ou como metáfora: “A idéia da fome é a mais antiga que existe. A idéia de antropofagia está ligada à fome, mas aqui fome é a vontade de tudo. Sem deixar de lembrar, que a Nação Zumbi é a banda mais faminta do mundo em relação à informação”.

Segundo Lúcio Maia, este foi um dos discos que deixaram os integrantes da banda mais satisfeitos. “É o nosso trabalho mais pra cima desde Afrocibederlia. Acho que também por causa de Mário. Neste disco não houve as confusões que aconteceram nos outros. Ninguém quis viajar antes de terminar alguma faixa, nem depois de pronta, achou que ela teria ficado melhor se houvesse sido feita de outra forma. É um disco que foi unanimidade entre os caras da banda”, diz o guitarrista.

(© JC Online)


Diversidade sonora continua forte

Logo na primeira faixa de Fome de tudo sente-se a influência de Mario Caldato comentada por Lúcio Maia, a leveza da guitarra, sem os overdubs dos outros discos. Bossa nostra tem a levada predominante em Futura, o canto quase falado de Jorge du Peixe. Mas as semelhanças acabam por aí. Infeste a faixa seguinte tem ritmo sincopado, batida quebrada, Jorge du Peixe está cada vez melhor como letrista, e seguro como vocalista de ótima dicção.

Um disco que varia de timbre e beat a cada faixa. A sincopada Inferno é bem diferente de Carnaval, a faixa anterior, que por sua vez não tem semelhanças com Nascedouro, que vem em seguida. Cada vez mais longe dos manguezais, a Nação Zumbi tem agora um som do mundo. Continua sendo a banda mais original do país, mesmo quando incorpora sonoridades da afrobeat de Fela Kuti à sua música, caso da citada Nascedouro.

A marca registrada da banda, os tambores ficaram quase sempre mais atrás na massa sonora, porém continuam sendo o diferencial do grupo. Uma das faixas em que estão mais pesados é em Onde tenho que ir. Toca Ogan deveria cantar mais no disco. É dele a voz da faixa Assustado, a mais radiofônica de Fome de tudo (que deveria ser trabalhada nas poucas rádios que ainda se permitem tocar música que não toca no Faustão). Assustado é um baião psicodélico, bastante melódico. Fome de tudo é pesadona, com a guitarra rasgando a massa sonora. A letra é uma das mais diretas e melhores de Jorge du Peixe, com um achado no refrão: ‘A fome tem uma saúde de ferro/forte como quem come”, a grande música do disco, com os tambores impecáveis e impiedosos, ótimas harmonias vocais, e Lúcio Maia ratificando seu talento como guitarrista.

Até a faixa final, No Olimpo, a Nação Zumbi continua sendo a banda que continua perseguindo a invenção, alheia a modismos, ou outras concessões. (J.T.)

(© JC Online)


Novo disco da Nação Zumbi ganha ouvinte nos detalhes

"Fome de tudo" é o sétimo registro da carreira dos pernambucanos. Céu, Junio Barreto e 'quarto beastie boy' estão entre convidados especiais

Shin Oliva Suzuki
Do G1, em São Paulo

Sempre se espera muito de um novo disco da Nação Zumbi. São raros os nomes do pop brasileiro na atualidade que conseguem conciliar uma carreira comercial com criação artística, e a banda pernambucana está entre eles. Em "Fome de tudo", a Nação confirma sua inscrição nesse clube e, novamente, alarga seu horizonte sonoro. Dá gosto de prestar atenção em cada detalhe do novo álbum. 

À esta altura da carreira, as influências que guiam a banda estão mais ou menos definidas, com psicodelia, metal, maracatu e música jamaicana como principais vetores. O desafio para a Nação Zumbi é jogar com o equilíbrio desses elementos. 

Claro que sempre se pode questionar a necessidade de uma levada nova, que surpreendesse os fãs logo de cara, ou a pouca variedade melódica nos vocais de Jorge Du Peixe, mas a banda refina (e aí faz a diferença) o que se encontra nas beiradas - são melodias e climas que merecem ser descobertos com fones de ouvido. 

Essa é a característica do disco, mas "Bossa nostra", a primeira música de "Fome de tudo", é mais direta. Traz um dedilhado irresistível de guitarra, de uma maneira que já pode ter aparecido antes em um disco da Nação, mas aqui aparece de forma mais consistente, como um cartão de visitas. É a que traz um impacto mais imediato e acertadamente serve para abrir o trabalho. 

Uma outra referência do grupo, o afrobeat, gênero em que reinou o nigeriano Fela Kuti, dá o sabor a "Infeste" e ao longo da canção se mescla com o universo dos tambores e das guitarras pesadas que é marca do grupo.  

"Inferno", com vocais que remetem a Rita Lee, utiliza de uma maneira não-óbvia a participação da cantora Céu, arrancando sensualidade onde se espera mais suavidade. Outro convidado especial é o tecladista Money Mark, que participa ativamente dos discos dos Beastie Boys e toca clavinete em "Assustado". De modo geral, Lúcio Maia, mais uma vez, prova que é um dos mais talentosos instrumentistas do país. 

O grupo consegue segurar o ritmo até o final, com "No olimpo", uma faixa de peso posicionada onde pouca gente hoje em dia tem paciência para chegar ao escutar um disco. Como um todo, a Nação Zumbi ainda faz valer o cada vez mais combatido conceito de álbum. 

(© G1)

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